O relatório dá conta da evolução do interesse por instrumentos de gestão passiva, em detrimento de gestão ativa, na zona euro. No entanto, o documento alerta também para alguns riscos que essa tendência representa.
Na passada quarta-feira, o Banco Central Europeu (BCE) publicou o seu já habitual relatório de análise da estabilidade financeira na zona euro, o Financial Stability Review. O documento, que assinala a sua vigésima edição, destaca o atual cenário global de incerteza, com o aumento das tensões no comércio global, bem como as geopolíticas. As pressões inflacionárias, com uma expetativa geral de crescimento económica mais fraca, face ao último relatório, são também salientadas. Além disso, apesar da resiliência geral apontada, a análise destaca a vulnerabilidade da dívida soberana de vários países da zona euro, bem como o risco de crédito para famílias, particularmente as que têm rendimentos mais baixos, e para pequenas e médias empresas.
Mercados financeiros sob pressão
No que concerne aos mercados financeiros, apesar de terem vindo a demostrar-se resilientes nestes últimos meses, há registo de vários “episódios de volatilidade breves, tendo impacto limitado no sistema financeiro em geral”, afirma Luis de Guindos, vice-presidente do BCE. “No entanto”, acrescenta, “as vulnerabilidades subjacentes dos mercados financeiros – particularmente valuations excessivas e concentração de riscos – permanecem significativas, tornando novos episódios de volatilidade mais prováveis do que o habitual”, esclarece.
Apetite pela gestão passiva
O documento dá ainda destaque ao aumento do investimento em instrumentos de gestão passiva, em detrimento da gestão ativa. No que diz respeito ao investimento em ações, em particular, e sob o pressuposto enunciado no relatório de que, em média, os retornos dos veículos de gestão ativa ficam aquém dos de gestão passiva, alguns investidores têm vindo a transferir os seus investimentos da gestão ativa para a passiva. Este movimento fica bastante evidente no primeiro painel da figura seguinte.
Já no segundo painel da imagem, observa-se que, ainda que o mercado acionista na zona euro esteja atrás do norte-americano em termos de investimento por meio de veículos de gestão passiva, segue a mesma tendência de crescimento. Convém, também, realçar que, como ilustrado no último painel, os investidores da zona euro estão expostos ao impacto do investimento em gestão passiva através, em grande parte, de ações dos EUA.
Riscos associados
Não obstante os benefícios que a gestão passiva possa proporcionar aos investidores, também pode estar em causa “a estabilidade financeira por meio de múltiplos canais”, segundo o documento, que enumera três riscos distintos:
- O impacto do investimento em gestão passiva no co-movimento dos retornos das ações na zona euro
Isto ocorre dado que os fundos de gestão passiva replicam índices, comprando ou vendendo todas as ações em bloco, sem considerar os fundamentais individuais de cada empresa. Esse tipo de negociação pode resultar numa maior semelhança nas transações entre ações no mercado acionista, aumentando o co-movimento entre os retornos e, por sua vez, a correlação.
- A concentração do investimento no mercado acionista
O investimento por meio de veículos de gestão passiva pode contribuir para a concentração do mercado de ações, expondo os investidores a maiores riscos idiossincráticos de empresas de maior dimensão. Isto porque os fundos de gestão passiva tendem a dar maior peso a essas ações, o que aumenta a capitalização de mercado e o peso nos índices. Tal pode causar uma maior concentração de liquidez nessas empresas e potencialmente aumentar o risco específico desses ativos no mercado.
- A concentração de liquidez no mercado
Os fundos de gestão passiva evitam negociar durante a sessão de negociação, preferindo negociar em leilões de fecho nos quais o preço final de fecho é determinado, para reduzir o tracking error em relação ao seu benchmark. Esta concentração de liquidez poderá contribuir para a deterioração da liquidez intradiária observada na última década. Assim, os investidores de gestão ativa desempenham um papel crucial na eficiência do mercado e na liquidez em períodos de maior volatilidade.