A perspectiva italiana da crise institucional que rebentou no país

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Moyan Brenn, Flickr

A vitória do não no referendo sobre a reforma constitucional derivou numa crise política e institucional na Itália, cujo clímax foi a demissão do primeiro ministro, Matteo Renzi. Depois de conhecer a opinião das gestoras internacionais sobre os efeitos que terá o resultado do referendo, a Funds People recolheu as reações das entidades italianas, com o objetivo de saber qual é a sua visão sobre o ocorrido. Segundo Alberto Foà, presidente da AcomeA SGR, o triunfo do “não” no referendo não é uma boa notícia. “Agora será mais difícil averiguar o que se vai suceder no plano político. O medo nos mercados e a incerteza aumenta. Para o “sim” havia um caminho traçado. Neste caso, abrem-se diferentes possibilidades e não sei o que se vai suceder”, afirma numa entrevista telefónica com a Funds People.

Quando fala da intranquilidade nos mercados, Foà refere-se ao efeito que pode ter sobre o sector financeiro. “A incerteza nos mercados, tanto nos de ações como nos de dívida, afetará, principalmente os bancos, onde existem dúvidas sobre a viabilidade das recapitalizações, não só do Monte dei Paschi di Siena (MPS), mas também do Unicredit. “O aumento de capital do MPS é muito importante para os mercados. Se houver uma moção de censura, isto poderá estender-se a todo o sector bancário, e em particular ao Unicredit”, augura. O presidente da AcomeA SGR reconhece que a atratividade do mercado italiano se reduziu. “Há uma atitude mais cautelosa por parte dos investidores internacionais, mesmo que não tenhamos visto grandes vendas, em resultado de uma posição de prudência prévia. Definitivamente, hoje terão menos vontade de comprar”.

Para Luca Noto, gestor de obrigações na Anima SGR, o resultado do referendo é uma confirmação e também uma surpresa. Esperava-se que o não ganhasse, embora não se imaginasse que o resultado fosse tão avultado. No entanto, o especialista sublinha a ausência de reações emocionais por parte dos investidores, já que todos reduziram as suas exposições. “A questão de como interpretar o resultado das urnas, tanto política como economicamente, continua em cima da mesa e apenas podemos saber os resultados nos próximos dias”, assinala. Luigi Dompé, gestor na Anima prevê que os serviços públicos e as entidades financeiras sejam as mais desfavorecidas, enquanto que outros sectores se mantêm imunes, como o industrial, a da energia e o de luxo”. Tanto Luca Noto como Luigi Dompé lançam uma mensagem de calma perante as previsões políticas e económicas que se estão a falar depois do resultado do referendo, muitas das quais consideram improváveis.

“Agora as prioridades serão a lei eleitoral, o orçamento e a tratar dos problemas do sector bancário italiano”, afirma Noto. De acordo com Dompé, está claro que o resultado do referendo complica a recapitalização dos bancos. “Solucionando-se o problema, ele conduzirá a uma redução da perceção do risco do mercado, em todo o seu conjunto. É importante recuperar o interesse dos investidores estrangeiros na bolsa de Milão”, indica. Segundo Carlo Messina, conselheiro-delegado da Intesa Sanpaolo, “há que analisar o impacto do resultado do referendo na economia real. O Governo italiano deve acelerar o processo de reforma. Está claro que têm de continuar a fazê-lo, sendo que o país tem uma dívida pública muito significativa. Na Europa, estamos num nível adequado de regulação bancária. Na minha opinião, o BCE fez um bom trabalho neste sentido e se se reduzir a regulação poderá ser perigoso neste momento”.

A situação do sector financeiro é algo que preocupa Pierluca Beltramelli, responsável na Aletti Gestielle. “Itália estava a preparar-se para a restruturação do sector bancário através de aumentos de capital, o que agora poderá desenvolver-se a um ritmo mais lento. Com a vitória do não a principal preocupaçãp é que se interrompa o processo de reformas estruturais, que são fundamentais num país com uma dívida elevada”, dizem.

No entanto, o especialista mostra-se confiante sobre as expetativas de crescimento do país. “Do nosso ponto de vista, as valorizações atuais já descontam num cenário negativo. O processo de restruturação dos bancos pode desacelerar, mas completar-se-á, e os bancos restruturados apoiarão a recuperação económica através de um aumento dos empréstimos à economia real”, conclui.

Numa linha muito similar expressa-se a Pioneer Investments, de onde preveem que a renúncia de Renzi pode parar os esforços realizados nos últimos anos para estimular a economia italiana. “Provavelmente vamos ver um pouco mais de pressão sobre o sector bancário italiano. Se se formar um governo rapidamente, estes riscos poderão conter-se e poderemos assistir a uma continuação do processo de restruturação com algum tipo de governo de coligação. Acreditamos que um cenário que volte a colocar em cima da mesa o debate sobre a ruptura do euro é pouco provável devido ao facto das partes terem fortes incentivos para formar uma coligação e completar a lei eleitoral antes da celebração das próximas eleições, apesar de ser provável que o Tribunal Constitucional requeira alterações para fazer com que o sistema seja proporcional”, assinalam os especialistas da entidade.