A Grécia volta à cena mediática. Depois de alguns meses em que as turbulências na China e a política monetária da Fed eclipsaram o drama grego, o país mediterrâneo volta a centrar a atenção da comunicação social. Nas eleições celebradas ontem o Syriza saiu vencedor, e o partido de Alexis Tsipras formará governo com os nacionalistas Gregos Independentes. O Executivo deverá ser anunciado até à próxima quarta-feira. Nas suas primeiras palavras depois da vitória Tsipras referiu que "a recuperação não virá por magia mas sim através do trabalho árduo”.
“Desde 2009 a Grécia tem vivido sete anos de crise, nove planos de austeridade, quatro governos, três planos de resgate e três programas de redução de dívida”, assinala Philippe Ithurbide, responsável global de análise e estratégia da Amundi. Apesar das extensas negociações mantidas durante esse tempo entre o país e os seus credores sobre as reformas estruturais necessárias, a recapitalização dos bancos gregos e o pagamento da dívida pública e privada, Ithurbide, sublinha que “a solvência da Grécia é um problema muito real e é pouco provável que a situação melhore sem a ajuda do exterior”.
No entanto, o especialista considera que existe muita confusão sobre este assunto, começando por questões básicas, tais como quanto dinheiro deve Grécia, e a quem, e se finalmente o país beneficiará de um perdão. Como se pode ver nos gráficos (vindo do relatório Cross-Asset de Setembro da Amundi), a dívida grega ascende atualmente a 321.000 milhões de euros, repartida entre diversos credores públicos e privados, embora os primeiros – o Mecanismo Europeu de Estabilidade, o FMI, o BCE e o resto dos países da Zona Euro – concentrem 80% dos empréstimos.
Relativamente a estes empréstimos, Ithurbide destaca as vantajosas condições negociadas em 2012, e com as quais o país desfruta de taxas de juro muito inferiores às do mercado, vencimentos de mais de 30 anos, e uma moratória de dez anos no pagamento dos juros sobre os empréstimos bilaterais e do MEEF.
Haverá perdão?
Tendo em conta que a Grécia beneficiou em 2012 de uma das maiores reduções de dívida do mundo, numa quantia próxima dos 100.000 milhões de euros, a dívida pública alcança atualmente 180% do PIB, agravada pela contração de 37% sofrida pelo PIB grego entre 2008 e 2014, segundo dados do Eurostat.
Perante esta situação, é inevitável perguntar se a dívida grega é de facto sustentável. “Apesar de tudo, com as vantajosas condições dos empréstimos, e com carga de dívida no começo do ano a representar menos de 3% do PIB – comparada com cerca de 5% de Portugal, pouco mais de 4,5% em Itália, cerca de 4% na Irlanda aproximadamente 2,2% em França ou cerca de 1,9% na Alemanha – a Grécia continua a enfrentar uma montanha de pagamentos que ascendem a cerca de 38.000 milhões de euros apenas em 2015”, explica Ithurbide.
“Segundo as estimativas do FMI de 2014, para que a Grécia pudesse alcançar um rácio de dívida sobre o PIB de 120% em 2022, necessitaria de gerar um superavit primário de 3% em 2015 e de 4% nos anos seguintes. Para além disso, as exportações teriam que crescer cerca de 4% ao ano e o investimento teria que aumentar de 10% para 14% nos três próximos anos e aproximadamente 7% nos anos seguintes. A combinação destes factores traduzir-se-ia num crescimento próximo de 3,5% em 2019 e de 2% posteriormente, mas este é um cenário bastante longínquo.