Gestoras analisam o significado da rejeição por parte dos gregos ao plano da Comissão Europeia, BCE e FMI, explicando as consequências que acarreta este resultado e as armas de que dispõe Mario Draghi para evitar o efeito contágio.
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A Grécia disse não à Europa e ao último plano proposto por Bruxelas. Os cidadãos helénicos tinham de se pronunciar sobre a sua corroboração com a proposta apresentada a 25 de Junho pela Comissão Europeia, BCE e FMI ou suportavam o seu Governo numa negociação de condições que lhes fossem mais favoráveis. E assim o fizeram dizendo não à última proposta de Bruxelas com uma participação que se aproximou dos 60%. E, agora… o que vai acontecer? Agora, ter-se-á que aguardar a resposta da Europa.
A curto prazo, o mais iminente é saber o que vai o BCE fazer esta segunda-feira com a linha de emergência para os bancos (ELA), que tem sido o balão de oxigénio e sobrevivência da banca helénica, muito embora as instituições financeiras contem apenas com 1.000 milhões de euros de liquidez. Disso dependerá o colapso ou não do sistema financeiro do país. As gestoras internacionais acreditam que não. “O resultado não transmite muito mais ‘claridade’ ao tema, mas também não provoca a saída imediata da Grécia da Zona Euro”, asseguram Laura Sarlo e Aimee Kaye, analistas de Loomis Sayles (Natixis Global AM).Na mesma linha de pensamento, pronunciam-se da Generali Investments Europe. “Apesar do ‘não’ afirmado pelos cidadãos gregos, isso não implica a saída do país do euro, embora seja mais um passo que vai nessa direção”. Igualmente da Robeco consideram que “com o ‘não’ há grandes probabilidades do país não ser capaz de cumprir com as suas obrigações financeiras, pelo que uma saída da Zona Euro parece cada vez mais provável”, explica Lukas Daalder, diretor de investimento da entidade. Para o especialista, o resultado do referendo terá um efeito decisivo na forma como evolucionará esta crise. “Pelo facto de não existirem condições concretas em conjunto com o referendo, é muito possível que o futuro da Grécia ainda não se decida depois do que sucedido na consulta popular de 5 de julho”. A nível político, algumas incógnitas parecem ter ficado esclarecidas. Como é natural, este resultado é um apoio ao Governo de Alexis Tsipras, quem abertamente encorajou os gregos a votar ‘não’. Neste sentido, parece difícil imaginar um cenário de queda do Governo. Muito pelo contrário. A nível interno, este sai reforçado, em total contraposição com o que acontece com a Nova Democracia – principal partido da oposição, cujo líder, o ex-presidente do país Andonis Samarás, defensor do ‘sim’ na campanha, se viu obrigado a demitir-se após o resultado à boca das urnas. No que diz respeito à resposta dos mercados financeiros, não se prevê que seja favorável. “As perdas nos mercados poderão ser substanciais numa fase inicial”, afirmam da Generali Investments Europe. Na Robeco também contam com um cenário em que “a volatilidade nos mercados financeiros permanecerá alta, pelo menos de momento”. O euro, um dos termómetros que marca a confiança na Zona Euro, vai sofrer um castigo inicial na ordem de 1%, o que o situa o seu câmbio face ao ‘bilhete verde’ abaixo dos 1,10 dólares.
A grande prova de fogo: o 20 de julho
O certo é que, após o referendo, os problemas permaneçam e os mercados possam a assistir a mais um longo período de capas de jornais sobre Grécia. O país tem que pagar ao FMI um empréstimo de 1.500 milhões de euros e, devido ao facto de não ter capacidade real para o fazer, necessita de um acordo com os seus credores. “Isto não quer dizer que a Grécia entre em default imediato, uma vez que o FMI dispõe de até 30 dias para estabelecer que uma contraparte não está a cumprir com as suas obrigações. Mas algo terá que acontecer com bastante rapidez, especialmente tendo em conta que um outro empréstimo por parte do BCE à Grécia de 3.500 milhões de euros também terá que ser pago no dia 20 de julho”, lembra Lukas Daalder, diretor de investimentos da Robeco. Se esse dinheiro não for devolvido, os especialistas consultados creem que o país entrará na bancarrota, sem a linha de financiamento por parte do BCE. “No pior dos casos, a Grécia não poderá cumprir com as suas obrigações financeiras, e o país ver-se-á obrigado a sair da Zona Euro”, assinala.
Posições políticas
Contudo, a julgar pelas primeiras reações políticas, não parece que exista uma vontade de ruptura nem por parte de Atenas nem por parte de Bruxelas. Após a vitória do ‘não’, o primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras, assegurou que o mandato que recebeu desta votação não era o de romper com a Europa, mas sim de reforço da sua posição nas negociações. “Hoje, segunda-feira, 6 de julho, a Grécia sentar-se-á na mesa de negociações para trabalhar dois aspetos: colocar em marcha o sistema bancário helénico e restituir a estabilidade económica no país. Estamos dispostos a manter as negociações com reformas justas e credíveis. Vamos colocar em cima da mesa o assunto da reestruturação da dívida, algo que o próprio FMI já reconheceu como necessário”. Tsipras aproveitou ainda para dar a deixa ao BCE para que não corte com a linha de financiamento extraordinária que mantém aberta com a Grécia. “Estou certo de que compreende a situação económica e humanitária que atravessa o país”.
Pelo seu lado, o presidente do Parlamento Europeu, Martin Schulz, afirmava que Atenas não se encontrava agora numa melhor posição para negociar. “A população grega disse ‘não’. É legítimo, mas o resto dos 18 sócios europeus estão de acordo com a postura que a Europa tem mantido. Agora, o Governo Grego tem que fazer propostas que possam convencer esses mesmos 18 membros. Negociar é necessário e possível, mas isso depende das propostas gregas. Espero que Tsipras possa fazer algumas propsotas construtivas e possível para pode negociar porque, caso isso não aconteça, podemos entrar em tempos difíceis e problemáticos”. Schulz também mencionou a necessidade de ativar um plano de emergência para a Grécia. “As crianças e os pensionistas gregos não devem pagar o preço pela difícil situação na qual o Governo grego colocou o país”
As duas armas das que dispõe o BCE para evitar o efeito contágio
Além do impacto que poderá provocar a crise grega sobre o país, está o risco de contágio a outros países. Segundo explicam da J.P.Morgan AM, a possibilidade contágio reduziu-se em grande medida, quando comparada com períodos anteriores de incerteza provocada pela Grécia, graças ao fortalecimento da economia e do sistema financeiro europeu e também à intervenção do BCE. “A autoridade monetária foi uma das poucas constantes nesta odisseia, garantido um certa tranquilidade aos mercados. O Tribunal de Justiça Europeu determinou o ajustamento do programa de Operações Monetárias Simples (OMT) aos tratados europeus e que o BCE tinha amplo poder para decidir sobre as suas condições, incrementado assim em larga escala as capacidades do banco central para aplicar medidas políticas extraordinárias adicionais que acalmem os mercados, caso isso seja necessário”, referem.
Neste sentido, os especialistas mostram-se convencidos de que o BCE fará o possível para evitar a extensão dos problemas gregos. A autoridade monetária estará muito interessada em deter o risco de contágio, pelo que usará qualquer instrumento que tenha à sua disposição, dentro dos limites do seu mandato, caso se revele necessário. Segundo explicam da Loomis Sayles, Mario Draghi dispõe de duas ferramentas chave. “A primeira é o Quantitative Easing (QE), que provavelmente já está a ajudar a moderar a reação do mercado às anteriores ‘explosões gregas’ (e este programa poderá ser ampliado ou aumentar se se justificar). A segunda é o programa de OMT, que ainda não foi testado, e que também permite a compra de dívida. No entanto, é possível que a implementação do OMT leve algumas semanas, já que depende da ativação de um programa do FMI em conjunto com o Mecanismo Europeu de Estabilidade (ESM) no país beneficiário”.