“Goodbye Yellow Brick Road… ”

Jorge_Botelho

O fenómeno de taxas de juro nulas ou negativas limita as opções de poupança ao afunilar as expetativas de retorno no médio e no longo prazo, tornando o caminho a percorrer mais longo e necessariamente mais sinuoso. Muitos obstáculos surgirão ao longo desta estrada serpenteada, obrigando por vezes a abrandar o passo. Tal como na história do Feiticeiro de OZ, também vamos precisar de encontrar a Coragem para o Leão, o Coração para o Homem de Lata e o Cérebro para o Espantalho, para investir em ativos financeiros.

Para muitos, o papel desempenhado pelos Bancos Centrais assemelha-se ao do Feiticeiro de OZ, um velho e cansado artista de circo, que detinha a destreza para ministrar um conjunto de truques de magia que iludiam os habitantes da Cidade de Esmeraldas, dissuadindo o atrevimento maléfico das Bruxas Más do Oeste e de Este. Na verdade, os truques de magia dos Bancos Centrais deixaram de iludir alguns agentes económicos, que manifestam ceticismo e desconfiança. Tanto mais que os Bancos Centrais têm demonstrado, muitas vezes, uma enorme inabilidade em resolver problemas prementes dentro dos seus domínios, como tem sido o caso da deficiente supervisão bancária. A magia do todo-poderoso Feiticeiro de OZ atirou as taxas de juro para níveis sem precedentes, movendo-se um conjunto considerável de feiticeiros em territórios impróprios.

Mas, se estes truques forem temporários, até podem ser benéficos, demostrando que os feiticeiros podem ter tido a capacidade de se surpreenderem a si próprios. A verdade é que alguns feiticeiros já abandonaram de balão o “paradigma das taxas de juro nulas”, enquanto outros parecem estar focados em tapar os buracos com remendos para começarem depois a encher o balão. Para já, o grande sucesso dos novos Feiticeiros de OZ foi permitir aos Estados, às empresas e às famílias, uma reestruturação passiva das suas dívidas, criando condições para uma melhoria substancial do perfil de endividamento de médio e longo prazo, permitindo a Dorothy procurar o seu caminho para casa ao longo da Yellow Brick Road. A crescente perceção de que a adoção de uma política monetária excessivamente expansionista por um período prolongado de tempo pode provocar efeitos perversos na economia, abre um espaço natural para a implementação e para a complementaridade das políticas fiscais, numa altura em que nos países desenvolvidos, os Estados assistem a uma redução substancial do serviço da dívida. Não deixa de ser assinalável que o total do outstandig da dívida pública alemã transaciona a um yield médio perto de zero.

A China pode bem ser o “Reino da Bruxa Má”, onde a opacidade da sua economia tem um caráter maléfico e que, por detrás das sombras, esconde-se uma bruxa verde de nariz corcunda. A avidez e a fixação desta Bruxa Má por notas verdes, justificou um rápido e excessivo endividamento da economia chinesa, sendo este um feitiço demasiado poderoso para poder ser quebrado em pouco tempo. A dívida total da China fechou neste último trimestre com um rácio de 249% sobre o PIB, quase mais 100 pontos que os registados no final de 2007. A solução para quebrar este feitiço pernicioso passa pela progressiva transformação da China numa economia mais assente nas dinâmicas do setor dos serviços e do consumo privado. Mas, para isso, é fundamental reduzir o excesso de capacidade industrial e provocar o ajustamento da economia através do reconhecimento das imparidades no sistema financeiro. Até se eliminar este terrível feitiço da “Bruxa Má”, temos de estar preparados para percorrer um penoso caminho repleto de contrariedades ao longo da Yellow Brick Road …

Paralelamente, os mercados emergentes continuam a ser uma economia única, onde a famosa sigla “BRICS” teve a magia de os fazer emergir, mas também o fado de tratar estes países quase sempre como uma economia agregada, em que cada um dos membros e dos seus respetivos companheiros mais próximos, quase perderam a capacidade de se poderem mover por si sós. As disputas entre a “Bruxa Má” e o mais poderoso de todos os Feiticeiros, o Todo-poderoso Americus, parecem ter agravado a situação, enquanto os Quadlings, os habitantes do Reino da Bruxa Má, largavam um óleo negro na Yellow Brick Road, tornando um caminho outrora luminoso, numa estrada baça, pouco percetível, muito escorregadia e propícia a grandes quedas... Os BRICS`s têm, na essência, problemas distintos e encontram-se em estádios diferentes entre si. Basta pensar o que uma recessão quase compulsiva no Brasil tem a ver com taxas de crescimento de 7,5% na índia, ou que, uma dependência de 70% das exportações de energia na Rússia tem a ver com o perfil das exportações chinesas. Mas estes países são apenas mais um brick na extensa Yellow Brick Road. Há que, por isso, procurar as oportunidades e não ter medo de abrir os Portões da Cidade das Esmeraldas e ver as suas cores!

Por tudo isto, será necessário recuperar a coragem do Leão para procurar ter uma visão independente e de longo prazo sobre o valor fundamental dos ativos financeiros. O mundo tornou-se demasiado pequeno e excessivamente mediatizado, majorando de forma assimétrica a incerteza. Não deixa de ser relevante que o prémio que se recebe por vender uma call “10% out of the Money” a 3 meses no S&P apenas financia a compra de protecção com um strike de 65%. De facto, a aversão ao risco é notória quando os investidores perdem a capacidade de olhar para o longo prazo. Esta realidade torna-se mais evidente quando os investidores não só estão dispostos a abdicar de retorno nominal, como a assumir um risco de retorno real negativo, investindo em ativos que não asseguram a sua poupança de longo prazo, como são hoje os ativos de taxa de juro de longo prazo dos Governos core.

Parece que estamos sempre à espera que o pior ocorra, perdemos demasiado tempo a sofrer com coisas que simplesmente não acontecem, nem têm forçosamente de suceder. Também será preciso encontrar um coração forte e resistente como aquele que procurava o Homem de Lata, para se investir em ativos de risco, onde o crédito na grande maioria dos setores de menor risco já esgotou o seu valor por completo. Reside apenas valor nas classes com maior risco implícito, como nos mercados de dívida emergente e de High Yield, onde se exige uma maior resistência e aguentar uma batida de coração mais rápida...

Tal como o Espantalho, também será preciso encontrar um cérebro ágil para se investir em ativos de maior risco, porque as oportunidades de investimento no mercado acionista global nem sempre são evidentes, pois parecem cada vez mais dependentes da forma intrínseca como os Bancos Centrais irrigam os campos para fazer germinar as sementes. Para além de ser preciso espantar a passarada, que cada vez mais aparece em bandos ensurdecedores, é necessário alargar mais o campo de visão, dado que o mundo de repente … encolheu. Aos nossos campos chegam agora aves raras de todo mundo, que transportam todo o tipo de doenças, algumas das quais nem conhecíamos...

No entanto, o que também a globalização nos transmite, é que os interesses políticos e económicos são irreversivelmente cada vez mais dependentes e consequentemente menos antagónicos. Na verdade, a grande maioria das aves que chegam aos nossos campos não os pretendem destruir, antes pelo contrário, querem e precisam de aprender e partilhar experiências.

Assim, para quem está disposto a acompanhar de forma metódica todo o processo de investimento e esperar pacientemente pela colheita, os investimentos em ativos de risco em termos globais continuam a ser as classes de ativos financeiros que, nos vão permitir garantir um retorno real, ao longo desta estrada em que se estende o ciclo da vida. Mas, não se iludam, porque não vai haver nenhuma estrada a reluzir para nos indicar o caminho:

- “…Caminante, no hay camino, se hace camino al andar…”. Antonio Machado