Para o analista júnior da Dolat Capital, "o playbook até ao final do ano deverá consistir na manutenção de uma perspetiva de longo-prazo e uma exposição robusta a diferentes classes de ativos não correlacionadas".
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TRIBUNA de Guilherme Mourão, analista júnior da Dolat Capital.
O primeiro semestre de 2023 contrastou significativamente com as expetativas delineadas no início do ano. Os alarmes de corrida aos depósitos começaram a soar com a queda do Silicon Valley Bank. Esta micro crise no sistema financeiro americano culminou na aquisição do Credit Suisse pela UBS, colocando termo à existência de uma instituição histórica e de natureza sistémica.
Ao contrário do previsto no início de 2023, o segmento com melhor desempenho no mercado de ações, no primeiro semestre, foi o tecnológico. A rápida popularidade obtida por Chatbots de Inteligência Artificial (IA), como o ChatGPT, resultou num conjunto de novas perspetivas sobre a forma como ferramentas de IA poderão expandir a eficiência de empresas, automatizar sistemas e auxiliar a tomada de decisões de um modo mais rigoroso, científico e livre de enviesamentos. Desenvolvimentos recentes nos campos da automação, robótica e terapia de genomas deverão contribuir para a manutenção, no segundo semestre, da tendência de desempenhos positivos no setor de tecnologia motivada pela expansão de múltiplos, ou seja, os investidores estão dispostos a pagar para ver.
Por outro lado, o consenso macroeconómico faz antever alguma pressão sobre os resultados empresariais, principalmente nos EUA. De acordo com o consenso, existe uma probabilidade de 65% de recessão nos próximos 12 meses. Tipicamente, desde 1978, o período entre a inversão das curvas de yield nos EUA e uma recessão é de 18 meses. Se o período entre a inversão das curvas for de 18 meses, uma recessão nos EUA ocorreria em fevereiro de 2024. Note-se, que o consenso, pela definição teórica, não prevê uma recessão até ao final do ano, mas sim uma desaceleração do crescimento económico do terceiro para o quarto trimestre.
Comportamento das principais economias
Relativamente ao comportamento das principais economias, o consenso de mercado prevê o seguinte:
- Na Zona Euro uma probabilidade de recessão de 42,5% nos próximos 12 meses e uma queda da inflação, ainda que a inflação subjacente continue elevada;
- No Japão, uma probabilidade de recessão de 30%, e a manutenção de níveis controlados de inflação (incluindo a inflação subjacente);
- A probabilidade de recessão na China é muito reduzida e uma provável desvalorização do Remimbi face ao dólar deverá potenciar as exportações do país até ao final do ano.
No que concerne aos mercados emergentes, em termos agregados, o consenso aponta para uma pequena subida da taxa de crescimento do PIB real, assim como uma queda moderada da inflação. Em particular, no Brasil e na Índia, as probabilidades de uma recessão nos próximos 12 meses são muito reduzidas, sendo que no Brasil é esperada uma desaceleração do crescimento real da economia nos próximos dois trimestres e o mercado antecipa um ligeiro corte nas taxas do Banco Central. Na Índia, a taxa de crescimento económico deverá manter-se num valor elevado e o consenso aponta para uma ligeira valorização da Rupia Indiana face ao USD.
Classes de ativos melhor posicionadas para enfrentar o semestre
Um portefólio bem diversificado e composto por ações, obrigações (com boa qualidade creditícia) e matérias-primas deverá ser o mais atrativo para fazer face às condições do mercado até ao fim do ano. A diminuição da correlação entre ações e obrigações para valores mais próximos do histórico protege o portefólio de riscos de drawdown, potenciados em períodos de recessão. Uma exposição diversificada (países e setores) às ações é também atrativa. Se um investidor tivesse optado por uma alocação de maior risco idiossincrático no primeiro semestre do ano, muito possivelmente teria ficado fora das rendibilidades provenientes das 10 ações com melhor desempenho do S&P 500. Ao estar exposto ao cabaz de ações que integram o índice, o investidor teria logrado obter ganhos na vizinhança 15% (moeda local), fruto da rendibilidade notável obtida pelas ditas 10 melhores.
As taxas elevadas e o ouro
As taxas elevadas, reveladoras da fase do ciclo do mercado de dívida atual, deverão permanecer. O mercado estima que a Reserva Federal norte-americana atingirá as taxas terminais na reunião de novembro com uma taxa de Fed Funds implícita de 5,4%. Relativamente ao BCE, o mercado prevê que as taxas diretoras terminais serão alcançadas nas reuniões de outubro ou dezembro.
A atual conjuntura permite, assim, que o investidor possa alcançar rendibilidades robustas no mercado obrigacionista, pela via da redução das taxas longo-prazo (ganhos de preço), quando os bancos centrais sinalizarem cortes nas taxas diretoras.
O ouro deverá continuar a registar um desempenho positivo até ao final do ano. Apesar dos elevados outflows de fundos de ouro, os bancos centrais continuam a comprar o metal. As compras deverão manter-se enquanto o outlook quanto a uma possível recessão global for incerto e o mercado estiver volátil. Adicionalmente, o previsível enfraquecimento do USD, após o ciclo de subidas das taxas de Fed Funds, incentiva os Bancos Centrais a continuar a comprar ouro.
O playbook até ao final do ano deverá consistir na manutenção de uma perspetiva de longo-prazo e uma exposição robusta a diferentes classes de ativos não correlacionadas, permitindo o investidor proteger-se de riscos associados à incerteza instalada nos mercados e capitalizar as novas oportunidades disruptivas proporcionadas pelos mercados acionistas.