O lado negro da força

Rui Alpalhão
Rui Alpalhão. Créditos: Vítor Duarte

COLABORAÇÃO de Rui Alpalhão, presidente da FundBox e professor no Instituto Universitário de Lisboa.

Em 2023, a Força esteve com os banqueiros centrais, que a usaram vigorosamente para subir as suas taxas diretoras. Lady Lagarde fê-lo seis vezes, Lord Bailey cinco vezes e Lord Powell, o mais lesto no uso da Força, três. E, a destros golpes de sabre de luz, a inflação desceu em toda a Galáxia.

Em 2024, os sabres permanecerão, crê-se, nas suas bainhas, exceção feita ao de Lord Ueda, também para confirmar a regra. A inflação, essa besta negra, está essencialmente controlada. Longa vida à Força. Fica o reverso da medalha: os efeitos adversos no serviço da dívida dos soberanos e nos bolsos de empresas e famílias. Bem-vindos ao lado negro da Força, o filme de 2024, a estrear numa economia perto de si. 

Registe-se, no entanto, que o FMI mantém estimativas de crescimento, ainda que esquálido, para as economias desenvolvidas. Se em Washington pontifica o otimismo, na China, pelo contrário, a estimativa de consenso é de travagem da economia, com consumo interno fraco e problemas no mercado imobiliário. São, pois, de esperar políticas públicas para suportar a retoma do crescimento.

Neste contexto global, os soberanos mais frágeis estarão na berlinda. O visível aumento do spread italiano é revelador.

Os mercados, na sua proverbial sageza, já levaram os preços a níveis incorporando expectativas benignas quanto ao lado negro, isto é, de um modo geral, os preços de mercado à data da escrita são consistentes com um ano sem recessão, antes com um crescimento moderado. Naturalmente, ou não, as valorizações das mega-cap techs americanas (as ditas Magnificent Seven) permanecem noutra galáxia, onde o realismo das previsões a cinco anos tem menos gravidade. Não são de esperar, pois, grandes rentabilidades nas classes de ativos convencionais, ações (onde as maiores capitalizações, com balanços fortes, deverão ser uma melhor aposta, porque menos sensíveis aos ventos do lado negro) e obrigações, com yields em valores não avistados nos tempos mais recentes.

O caso muda de figura quando pensamos em commodities, que tenderão a beneficiar da transição verde e que beneficiarão se a geopolítica voltar a pressionar o preço da energia. O ouro subiu abruptamente após os ataques do Hamas em Israel, fenómeno pontual que as altas taxas de juro, com o consequente alto custo de oportunidade de investimento em ativos de refúgio, tendem a tornar pouco sustentado.

Da mesma forma que esperamos que, ao acionar o travão de uma viatura, atinjamos o objetivo de a imobilizar, devemos reconhecer que domar a inflação carregando no travão das taxas de juro leva a parar a economia. E, tal como os automóveis (mesmo os bons…), também as economias não param assim que se carrega no travão. Assim, o principal risco para 2024 é a recessão. E uma boa cobertura para este risco são as obrigações.

Risco, em finanças, também tem dois lados, o negro downside risk, e o bom upside risk. E, se o lado negro da Força não se manifestar, e o lesto Lord Powell começar a cortar as taxas de juro, então as ações terão muito para oferecer, sem que seja necessário que as taxas baixem para os anormais níveis do pós-Grande Recessão.

Por outro lado, as tensões de índole geopolítica (Médio Oriente, Ucrânia) estão presentes, e podem traduzir-se em riscos significativos para asset allocators. Considerando downside e upside risks, mesmo os descrentes no lado negro terão interesse em construir carteiras com um bom equilíbrio entre obrigações e ações. Nestas, as melhores apostas parecem ser em tribos muito dissemelhantes, por um lado as colossais magnificent seven e por outro as pequenas capitalizações, cujo sofrimento diferencial no ano que está findando levou a valorizações atraentes, ou, melhor dito, compatíveis com um cenário recessivo.

Nas obrigações, quanto menor o risco de crédito maior a possibilidade de outperformance. Com o lado negro à vista, soberanos, MBS e investment grade corporates são bem mais atraentes do que opções mais aventurosas. 

Na FundBox continuamos convictamente alternativos, e estaremos, para combater o lado negro, oferecendo um luminoso fundo em solar farms no nosso solarengo país.

Que a Força esteja convosco no Novo Ano.