“Somos agnósticos em termos de estilo, entre qualidade, crescimento ou rendimento”

martin_skanberg
Cedida

Desde que houve uma melhoria na Europa, nomeadamente em meados do ano com as declarações do BCE, o que mudou na gestão do fundo? Houve alteração de estratégia, de temas de investimento?

Sim, muitas.  A forma como gerimos este fundo é bastante pragmática,  no modo como construímos a carteira com uma base 'bottom up'. Focamo-nos sempre em acções individuais. E o que tentamos fazer é perguntar a nós próprios não tanto se esta é uma boa ou uma má empresa e se queremos estar investidos nela, mas o que está a avaliação do mercado a incorporar no que se refere ao 'outlook', a crescimento das vendas ou lucro da margem operacional. Este é sempre o ponto de partida. Resumindo, o Euro Equity Fund é pragmático no estilo, não temos nenhum estilo preconcebido, no sentido em queremos estar 'overweight' em qualidade ou empresas em crescimento na Europa, ou então olhamos só para oportunidades em termos de valor, ou rendimento, ou 'dividend yield'. Somos pragmáticos dentro de todo esse espectro. Tal permite-nos escolher diferentes acções, em diferentes condições de mercado, mas resume-se tudo a onde podemos conseguir uma visão diferente em termos de margens, crescimento de vendas da empresa, retornos do balanço. O ponto de partida é a avaliação.

Em concreto, o mudou?

Desde Julho, as condições de mercado melhoraram um pouco, não que tenha havido necessariamente uma melhoria nas condições económicas. E o que começámos a ver foi as 'yields' das obrigações a descer no sul da Europa, a valorização das acções a subir, alguns dos países, sectores, acções, que eram considerados 'portos seguros' - estou a pensar em acções de empresas alimentares, de bebidas, suíças -, todos estes que tiveram um desempenho acima da média nos últimos anos, ficaram um pouco vulneráveis num cenário normalizado, que foi o que começámos a ver em Agosto. Portanto, os 'tail risk events' foram removidos; começámos a mudar a carteira antes de isso acontecer, o que nos deu a possibilidade de mudar muito mais. Exemplos do que temos estado a fazer: passámos de 'overweight' na Alemanha para 'underweight' actualmente; como disse focamo-nos em acções individuais, onde podemos ter uma visão diferente, onde há uma oportunidade por estar avaliada incorrectamente; e portanto temos estado a vender Alemanha e a reciclar os proveitos para Europa do sul e para França; o mercado tinha estado nervoso sobre o país devido nomeadamente às eleições e isso deu-nos oportunidade de comprar bem algumas empresas líderes globais de primeira classe, como por exemplo, de bens de luxo, de manufactura, de software, mas também alguns bancos. Eram acções que estavam a transaccionar com desconto político. E passámos a 'overweight' em França. E no sul da Europa também. Por exemplo, em Outubro/Novembro 2011 estávamos 18% 'underweight' nos PIIGS, com Espanha e Itália a serem aqui os países-chave, e a partir do final desse ano começámos a comprar e, actualmente, estamos 6% 'underweight', ou seja, comprámos cerca de 12% do fundo principalmente em Itália e Espanha. 

O posicionamento global de uma empresa é uma mais-valia...

A escala global, a inovação global,  a distribuição de produtos, que vêm com a liderança. E muitas das empresas com estas condições encontram-se na Europa. São activos únicos. Depois além destas histórias temos também estado a posicionar-nos selectivamente noutras, como algumas de reestruturação. Tradicionalmente são um pouco mais cíclicas e têm um pouco mais de risco em termos de ganhos a nível doméstico, porque a Europa está a melhorar na base - défices da conta corrente a diminuir, importações a descer, exportações a recuperar, competitividade a melhorar lentamente -, mas há histórias específicas de como podem cortar custos, eventualmente desinvestir num mau negócio, focar nas operações 'core' e por vezes até separando a empresa em dois, às vezes dois pedaços podem ser mais valiosos do que uma junção que não funciona. Portanto temos comprado algumas dessas histórias, é um pouco mais de risco mas onde o 'upside' é muito maior.

E agora qual é o foco?

Do que estamos à espera agora é da próxima combinação de ‘re-rating’ e crescimento dos resultados e reafectação de balanços muito fortes; têm estado a acumular dinheiro, a fazer empréstimos muito baratos, veremos muito mais M&A este ano, vão reinvestir em 'capex'. Portanto assistiremos a esta combinação gémea de um contínuo ‘re-rating’ de activos de risco, acções, especificamente acções europeias, que estão baratas, têm resultados baixos, mas que vão melhorar. Tudo se resume a confiança. Este ‘re-rating’ do mercado não tem sido gerado por confiança, mas a minha expectativa é que aumente no decurso deste ano, estimulado pela Europa 'core' como o Reino Unido e a Alemanha, pelos Estados Unidos. E apesar de a confiança ter estado baixa, os dados económicos têm vindo a recuperar ligeiramente e penso que irá começar também a melhorar, possivelmente até no sul da Europa, porque se está a conseguir fechar o défice da conta corrente, a normalizar. Quanto ao prémio de risco das acções europeias, que esteve muito elevado desde 2007, tem estado a diminuir, mas continua muito elevado, é uma forma de expressar que as valorizações continuam atractivas. E o estranho é que a volatilidade está muito baixa e tem estado também a diminuir. Portanto, a correlação entre acções e países quase desapareceu, estão descorrelacionados, o que é óptimo para fazer 'stock picking'. Posso olhar e dizer que é uma boa companhia ou má companhia e não está avaliada ao preço justo e não tenho que me preocupar se é em Espanha, Alemanha ou Japão. É por isso que penso que o 'stock picking' vai ser tão importante.

Qual é a expectativa para o mercado de obrigações?

Nas obrigações esperamos um 'bear market', sobretudo nos 'safe heavens', pode haver algumas subidas de 'yields' do lado do crédito ou empresarial. Portanto, os investidores em obrigações precisam de pensar onde vão conseguir retorno. Nos últimos anos todo o dinheiro foi para obrigações, especialmente as dos 'safe heavens', provavelmente um pouco para acções, mas EUA ou mercados emergentes, mas muito pouco, e a grande maioria dos 1,7 triliões de dólares foi para 'fixed income'. Uma pequena parte desse valor tem começado a sair e penso que é o que vai levar a uma ligeira subida no preço nominal das obrigações. Quanto às 'yields', o 'dividend yield' está muito mais elevado que a juro real das obrigações. Com a emissão de obrigações tão elevada como tem sido nos últimos anos, as 'yields' das obrigações corporativas para muitas empresas têm caído 2,5%, têm emitido muita dívida, barata, e, a não ser que acreditem num grande 'crash', vão ter que dar uso a esses fundos, quer recomprem acções próprias, porque é barato, ou reinvistam em capex, o que penso que farão e daria suporte à economia, e depois o grande desafio é provavelmente o M&A selectivo, de grande escala. Se os ‘re-rating’ não acontecerem, os players' industriais vão começar a movimentar-se e eu vou querer esses. E começamos já a ver um pouco disto... a Liberty a comprar a Virgin Media...e continuaremos a ver estendendo-se nomeadamente à Europa continental. Este será um tema, mas nunca se pode comprar acções só nesta base, queremos olhar para o nosso triângulo e perceber a empresa, qual a valorização que está implícita considerando o potencial de vendas, ou margem operacional, ou alterações no balanço..., e se consideramos que a avaliação é demasiado 'bearish' tendo em conta estes pressupostos. E pode ser uma boa empresa que está muito barata, ou empresa de menor qualidade que está demasiado barata tendo em conta a valorização implícita, desde que sintamos que algo vai melhorar e ser um catalisador. Essa é a nossa aproximação à Europa, somos somos agnósticos em termos de estilo, entre qualidade, crescimento ou rendimento. A única coisa que nos preocupa é se temos o posicionamento errado em termos de país ou sector. Mas porque a correlação baixou tanto este é mais um ambiente de 'stock picking'.

Há pouco referiu que está menos 'underweight' nos periféricos, inclusive Portugal, como é que olha agora para o país, economias, empresas?

Não estamos a olhar para países especificamente. Mas no geral, a minha avaliação sobre Portugal é que continuará a ser muito penalizado por um cenário de baixo crescimento durante bastante tempo. Mas, como dizia anteriormente, a economia subjacente, tal como em Espanha, está a melhorar. Pode não se sentir isso, mas na verdade os números parecem provar que a economia está a ficar mais equilibrada e menos dependente de entradas de capital do exterior para financiar os consumos correntes, no sentido em que o défice da conta corrente está genericamente equilibrado. O que acontece porque baixaram muito as importações, devido à quebra no consumo, e as exportações começaram a melhorar um pouco. E também o défice subjacente da despesa pública está a ser atacado. Penso que é também por isso que a Europa está a enfrentar para estas situações de forma mais corajosa do que outros países fora da Zona Euro. A dor que a Europa, nomeadamente a do sul, está a sofrer, é o princípio de um longo período de cura. Durante algum tempo ainda será pressionado pela falta de procura, mas na base penso que cria as condições para uma melhoria do desempenho económico ao longo dos próximos anos. O mesmo também se vê em Espanha e até na Grécia. Penso que a Europa está a enfrentar as questões de cabeça levantada, claro que a questão da revolta social tem sempre que ser uma preocupação, mas penso que há coesão, não há inflação no sistema, o que alivia um pouco as coisas. Penso que os progressos são sólidos. Agora não vai haver crescimento de salários na Europa, vamos ter sim aumento de resultados no mundo empresarial, é melhor ser um accionista que um cidadão português, e o mesmo é verdade também para o Reino Unido, Suíça e Estados Unidos. É a verdade simples. O que não quer dizer que dentro de três, quatro anos, as coisas voltem a mudar, desde que se criem as condições e haja vontade de implementar as reformas necessárias. A única excepção é a Alemanha, onde os custos unitários do trabalho têm sido muito baixos, extremamente competitivos. Penso que Portugal está, lentamente, a ir na direcção certa, irá estar muito pressionado durante muitos anos, mas há empresas específicas que podem retirar vantagens daí exportando para fora da região.

Têm portanto empresas portuguesas na carteira do fundo...

Sim, temos, não vou mencionar nomes. Mas há tipicamente boas empresas exportadoras, nomeadamente, nas áreas das ‘utilities’, da energia. Não entramos nas áreas do bancos e das seguradoras na Europa do sul, nesta região temos estado a olhar mais para activos industriais, ou tecnológicos e ‘utilities’.