Um contexto como o atual cria dispersão e oportunidades. Depois de uma conversa em que as perspetivas e os riscos para os mercados, nos próximos meses, estiveram em cima da mesa, percebeu-se em que terrenos se pode encontrar afinal valor nos próximos meses. Nesta conversa dinamizada pela FundsPeople em colaboração com a abrdn, falou-se do inevitável regresso da yield ao mercado, da maior exploração do campo das obrigações, mas não deixando de fora espaços de oportunidade dentro das ações.
CINDY, quem és tu?

João Paulo Silva, do novobanco, começou por relembrar que o acrónimo TINA (There Is No Alternative), que até há bem pouco tempo era a súmula perfeita para os mercados, deixou de ter lugar no contexto atual. Recordando algo que ouviu recentemente, introduziu no debate a CINDY (Credit Is Now Delivering Yield), a nova a Era a que os mercados se têm de habituar - e tirar partido.
Nesse sentido, o profissional do novobanco explicou que no universo das obrigações gosta mais de “maior qualidade”, por ser iminente uma recessão. “Por qualidade, entendemos obrigações do tesouro - dos EUA ou Europa - mas especialmente dos EUA, porque providenciam yield, mas também porque as obrigações do tesouro americano são um refúgio no mercado de rendimento fixo”, afiançou.
Adicionalmente, o profissional expressou uma forte preferência pelo espetro de investment grade. “Apesar de todo o universo do rendimento fixo ser atrativo atualmente, neste em específico vemos uma atratividade ainda maior em termos de preço, comparativamente com o high yield em específico, ao qual se adiciona o fator qualidade”, referiu João Paulo Silva. Estas empresas do segmento de investment grade, enfatizou, “ainda não assistiram à recessão dos lucros, conseguem financiar-se, e têm balanços muito fortes”, concluiu.
1/4Também da opinião de que as obrigações têm agora espaço para vingar dentro dos portefólios é João Pisco, da Alvarium Tiedemann. Apesar de verem oportunidades na classe de ativos, realça, não ser a favor de se tomar “riscos de crédito indesejados” - ou mesmo de duração - para assim se chegar a uma yield atrativa. “Podemos entrar em obrigações com um rating elevado, de curto prazo, e ainda assim obter à volta de 5% de yield, no caso dos EUA, e retornos não muito diferentes na Europa”, começa por assinalar.
Nesse sentido, João Pisco reiterou que a pressa em subir no espectro de risco é muito pouca. “Não estamos com pressa em adicionar risco ou high yield ao portefólio. Isto porque conseguimos obter yields muito atrativas no segmento de investment grade, e é aí que nos estamos a focar. Estamos também, claro, focados em procurar gestores flexíveis, que possam entregar valor no seu trabalho e aproveitar de forma muito seletiva as oportunidades que os segmentos de maior risco oferecem”, salientou. Paralelamente, mantêm as ações debaixo de olho, mas de forma muito seletiva, devido às incertezas económicas e ao fator volatilidade. “Estamos a olhar para os losers of the past decade, ou seja, aquelas empresas que se saíram pior na década passada, e que serão, provavelmente, os vencedores da próxima década”, revelou. Empresas mais aborrecidas e defensivas, como o próprio indica, e também capitalizações mais pequenas. “Temos uma preferência por empresas de pequena/média capitalização face às empresas de grande capitalização, especialmente nos EUA, dada a tendência de “onshoring” das cadeias de produção, a que temos vindo a assistir, e que favorece esse tipo de empresas”, aponta. De destacar ainda o interesse por hedge funds. “Continuamos a favorecer este tipo de estratégias, sobretudo estratégias mais descorrelacionadas e de retorno absoluto, que, à partida, continuarão a sair-se bem caso a dispersão e a volatilidade nos mercados financeiros se mantenham elevadas”, rematou.
2/4Para Álvaro Antón Luna, esta é altura certa para olhar para o que são empresas bem geridas. E quando fala desse conceito, alerta que não se refere apenas às empresas de qualidade per se. Contudo, e em linha com os anteriores profissionais, as obrigações são, sem dúvida, o sítio mais interessante, mas, tal como João Pisco abordava, a precaução é necessária. “Temos os nossos portefólios posicionados de forma cautelosa, e vemos ainda valor nas obrigações governamentais”, salientou o profissional da abrdn. Estão positivos também em investment grade, bem como em dólar norte-americano. Esta última é mesmo “a maior sobreponderação” que apresentam à data desta conversa.
Na opinião do especialista, “os spreads vão alargar em breve”, algo a que se poderá assistir na segunda metade do ano de 2023. Nos primeiros seis meses do ano, contudo, o profissional da abrdn acredita que o crédito IG sairá beneficiado. Paralelamente, em high yield vislumbram também algumas oportunidades. Genericamente, dentro do fixed income, vê muito valor em “bancos, híbridas corporativas e no setor automóvel”.
Dentro das ações, vê nas bolsas europeias e inglesa alguma atratividade, pois tratam-se, na sua opinião, de ações “realmente subvalorizadas”. Nesse sentido, atenta que este é o verdadeiro momento para os stockpickers. Como também já assinalado na conversa, as empresas de pequena e média capitalização são aquelas que merecem da entidade maior convicção. “Acreditamos que nesta recessão, com um pendor anti-globalização, é uma mais-valia ter posições neste tipo de empresas”, salientou. Em termos de setores, vê possibilidades de valor nos setores de tecnologia, saúde e consumo. Isto enquanto vê a sustentabilidade a voltar como tema de investimento em 2023.
3/4Em total concordância com os colegas de painel, Francisco Louro está ciente de que “em obrigações existe yield, finalmente”. Embora o seu campo de trabalho sejam principalmente as ações, é da opinião de que ainda não existe assim tanto valor em high yield, atualmente. “Acho que o spread entre o high yield e o ativo livre de risco é muito pequeno, e se olharmos exclusivamente para este indicador o high yield não está de todo barato”, avisou o profissional da BlueCrow.
No terreno ao qual mais se dedica - as ações - fala de “muitas oportunidades”. O profissional da BlueCrow acredita que para os investidores de longo prazo e pacientes, essas oportunidades existem mesmo. “Acredito que a diferença entre este período que vivemos e o dos anos 2000, é que se olharmos para o setor de tecnologia, existem empresas muito diferentes dentro do mesmo setor”, começou por assinalar. Embora concorde com este chamamento das empresas de média/pequena capitalização frisado pelos colegas de debate, o profissional é a favor de alguma cautela. “Para mim, uma empresa de pequena capitalização negoceia como um risco, o que configura a profundidade e duração de uma possível recessão”, alerta. Recorda mesmo que, historicamente, quando existe uma recessão profunda, “as small caps têm sido as empresas que sofrem mais”, mas são “aquelas, que sobram, que voltam à boa forma mais rapidamente” quando as coisas melhoram. Assim, e apesar de ser da opinião de que a possível recessão que se avizinha venha a ser bastante mais leve do que outras no passado, se eventualmente “for mais profunda e longa do que aquilo que se espera”, acredita que quem inicie agora uma posição em small e mid caps, “arrisca ter uma performance mais baixa face àquilo que o mercado perceciona, neste momento”.
Nesse sentido, neste momento, é a favor de “escolher os gestores que são verdadeiramente stock pickers”, e aqueles que são “alinhados com os interesses” dos portefólios que gere, e com a perspetiva de longo prazo dos mesmos.
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