O diferente ritmo de vacinação ameaça uma recuperação mundial sincronizada

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Créditos: Markus Winkler (Unsplash)

A primeira semana de novembro de 2020 marcou um ponto de inflexão na pandemia. Nessa semana a Pfizer anunciou uma eficácia de 90% da sua vacina contra a COVID-19 e nos dias posteriores outras farmacêuticas deram notícias semelhantes.

Os mercados, os governos e também os cidadãos interpretaram as notícias como o princípio do fim da pandemia e o primeiro passo para um regresso à normalidade, tanto do ponto de vista social como do económico.

No entanto, nas últimas semanas, ficou demonstrado que esse caminho até à normalidade que traz consigo uma recuperação económica global não estará isento de obstáculos. E um deles é o ritmo de vacinação, que vai influenciar o facto de que, por ser diferente dependendo das regiões, tira a possibilidade de ver uma recuperação económica sincronizada a nível global.

OTIMISMO MODERADO

De facto, a expectativa dessa recuperação, que sofreu um novo atraso temporal quase à escala global, é muito diferente dependendo da zona geográfica. “A maioria dos executivos continua a acreditar que as condições das suas economias nacionais e da economia mundial vão melhorar nos próximos seis meses. Não obstante, o seu positivismo ficou mais moderado face ao inquérito anterior. Em comparação com dezembro, uma menor percentagem de inquiridos prevê agora que as condições económicas vão melhorar”, afirma a última atualização de um estudo da McKinsey no qual se analisa o sentimento dos executivos.

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Porém, esta deterioração na expectativa da economia nota-se em quase todas as regiões, com a única exceção da Índia e da América do Norte. “A implementação do programa de vacinação nos países desenvolvidos deverá permitir que as economias recuperem mais rapidamente no segundo semestre do ano, à medida que a normalidade volte e que os consumidores possam finalmente usar as suas poupanças acumuladas”, afirmam na J.P.Morgan AM. E na gestora situam os EUA e o Reino Unido acima da Europa nesse caminho para a normalidade. “Esperamos que o Reino Unido e os EUA tenham vacinado mais de metade dos seus habitantes durante o primeiro semestre do ano e que a UE o consiga durante o verão”, afirmam.

O DIFERENTE RITMO DE VACINAÇÃO POR REGIÕES

Com os dados na mão, se se mantiver o ritmo de vacinação que se iniciou em dezembro, é previsível que a gestora americana tenha razão. “Com 8,31 vacinados por cada 100 pessoas até à data, os Estados Unidos estão a levar a cabo o desenvolvimento estatal das vacinas da Pfizer e da Moderna a uma velocidade vertiginosa, com pelo menos 6,8% da população que recebeu uma das duas doses do medicamento e 1,4%, o ciclo completo. No Reino Unido, 11,1% da população recebeu a primeira injeção e 0,7% recebeu as duas, com 355.173 doses diárias em média. Pelo contrário, na UE, só 2,46 pessoas a cada 100 receberam já pelo menos uma injeção, o que indica um ritmo notoriamente mais lento na distribuição das vacinas”, afirmam na Monex Europe.

E, de facto, de acordo com as últimas previsões do FMI, espera-se que os EUA, cuja expectativa de crescimento melhorou, devam recuperar os seus níveis de crescimento anteriores à COVID-19, ao mesmo tempo que cortam a sua expectativa de crescimento para a zona euro em 1 ponto percentual para este ano. Afinal, como explica Ahram Gharbi, responsável de Investimentos High Yield da La Française AM, “na Europa há muitas restrições às economias e a campanha de vacinação está a ser menos rápida do que em outras economias. Além disso, existem riscos políticos na Europa que já não existem nos Estados Unidos após a vitória de Biden, como as eleições na Alemanha e na Holanda e ma crise governamental em Itália”.

NOTA-SE A DISPERSÃO DOS MERCADOS?

A descida das expectativas económicas unida ao forte rally que se viu nos mercados, sobretudo, no último trimestre do ano provocaram uma realização de mais-valias nos mercados de ações. Vê-se no comportamento dos principais índices de ações, com exceção dos asiáticos, foi negativo no primeiro mês do ano.

A questão é se esses números vermelhos vão durar muito tempo além do mês de janeiro. Nesse ponto, duas ideias convergem: o otimismo de que se os bancos centrais e os governos vão continuar com os planos de resgate; e o risco de que essas medidas não sejam suficientes para escapar a uma dupla recessão que, junto com as altas valorizações, podem trazer consigo fortes correções em ativos de risco.

Atualmente, opta-se mais pela primeira opção, já que contam, além disso, com o apoio dos resultados empresariais. “As condições podem permanecer propícias para os ativos de risco durante um tempo. A temporada de apresentação de resultados está a oferecer surpresas positivas muito fortes, tanto na parte dos lucros, como das vendas”, afirma a Gilles Möec, economista da AXA IM.

Além disso, segundo explicam na BlackRock, em termos gerais das valorizações dos ativos não estão ainda em níveis tão elevados pelo que preveem que “as reduzidas taxas de juro – e a reativação da atividade impulsionada pela vacina - vão apoiar os ativos de risco nos próximos seis a doce meses”.