Estarão os investimentos verdes sobrevalorizados?

Anne-Claire Abadie
Anne-Claire Abadie. Créditos: Cedida (Sycomore)

TRIBUNA de Anne-Claire Abadie, gestora de fundos - especialista em ambiente, Sycomore AM. Comentário patrocinado pela Sycomore AM.

Depois de um 2020 excecional e de resultados muito sólidos no início de 2021, as ações verdes com exposição à transição energética e ecológica sofreram, recentemente, uma correção de mercado bastante forte que afetou o setor das energias limpas de forma particularmente acentuada.

  • Qual é a sua perspetiva acerca das valorizações neste setor? As ações verdes estão demasiado caras?
  • A correção recente marca o início de uma alteração de tendência ou, pelo contrário, representa uma oportunidade de investimento?

Como se explica esta correção brusca?

No geral, os índices sustentáveis têm vindo a registar um pior desempenho desde meados de janeiro, em grande medida devido ao reequilibro do índice S&P Global Clean Energy. Este índice de mercado, replicado por três ETF com quase 12.000 milhões de dólares em ativos geridos, inclui apenas 30 ações e influencia de forma decisiva os preços das ações: em alguns dias, os ETF chegaram a representar mais de 25% dos volumes de negociação diários.

O receio de uma possível subida nas taxas de juro e a esperança de uma recuperação económica levaram os investidores a reorientar as suas carteiras para setores value, o que levou à realização de lucros nos segmentos que melhor se comportaram no ano passado: os investimentos sustentáveis, em geral, e as energias renováveis, em particular.

Que perspetivas de lucro apresentam estas empresas?

Prevemos que os lucros das empresas relacionadas com a transição energética e ecológica cresçam nos próximos anos? É legítimo falarmos de hipercrescimento? As respostas a estas perguntas terão de ser validadas, uma vez que variam de acordo com o segmento de mercado e a empresa, como mostram os exemplos seguintes:

  • Está previsto um crescimento da capacidade solar instalada na ordem dos 90% nos próximos cinco anos e uma duplicação do volume de eletricidade gerada até 2050*.
  • Estima-se que os pontos de carregamento de veículos elétricos cresçam entre 35% a 40% ao ano nos próximos cinco a dez anos, partindo-se de um nível de capacidade instalada muito baixo*.
  • O ritmo da reabilitação de imóveis poderá triplicar graças ao Plano de Recuperação europeu, o que terá um impacto considerável na faturação das empresas.
  • No entanto, no segmento das infraestruturas hídricas, o crescimento dos lucros terá tendência a estar mais alinhado com o crescimento do PIB, ainda que as necessidades dos EUA sejam bastante diferentes devido ao envelhecimento das infraestruturas no país.

Relativamente ao crescimento dos lucros, as nossas expectativas variam entre mais de 50% no caso de alguns segmentos mais dinâmicos e das suas cadeias de valor a montante (pontos de carregamento de carros elétricos, aerogeradores, fabricantes de componentes elétricos...) até taxas de crescimento muito mais modestas nos próximos cinco anos.

Nos subsetores da construção sustentável, prevemos que o lucro por ação (EPS) líquido se situe entre 20% e 60% em 2021, para depois normalizar na casa dos 10% a 15% anuais com divergências entre as várias empresas, dependendo do seu peso regional, da sua exposição aos setores da construção e reabilitação e da sua gama de produtos.

O setor da economia circular, na perspetiva das empresas de gestão de resíduos, também pode experienciar uma recuperação semelhante. Na cadeia de valor das bicicletas, o crescimento do lucro por ação deverá manter-se à volta de 15% a 20% em 2021, apesar da procura muito forte, devido às tensões existentes nas cadeias de fornecimento, e poderá oscilar entre 5% e 10% nos segmentos de infraestruturas elétricas, serviços de energia ou infraestruturas hídricas.

O que nos pode dizer acerca do seu fundo sustentável, o Sycomore Eco Solutions?

O Sycomore Eco Solutions investe em empresas com modelos de negócio que contribuem para a transição energética e ecológica em cinco áreas: mobilidade, energia, reabilitação e construção, economia circular e atividades ligadas aos ecossistemas. Para serem incluídas no nosso universo de investimento, as empresas têm de demonstrar que o seu impacto no ambiente é positivo, algo que medimos através da sua contribuição ambiental líquida (Net Environmental Contribution ou NEC), um indicador específico desenvolvido pela Sycomore para evitar as falhas de outros indicadores do mercado. A pegada de carbono, por exemplo, aborda apenas um aspeto ambiental, sem dúvida importante: as alterações climáticas. A NEC é um parâmetro alternativo que integra vários critérios ambientais, como as alterações climáticas, a escassez de recursos naturais, a biodiversidade, a água ou a qualidade do ar.

Como se reflete tudo isto na carteira do Sycomore Eco Solutions?

Ainda que as perspetivas variem muito de um setor para o outro, o crescimento do lucro por ação médio estimado para a carteira do Sycomore Eco Solutions ronda os 30% em 2021, em linha com o crescimento registado pelo setor tecnológico. Ao selecionar empresas com modelos de negócio que contribuem ativamente para a transição energética e ecológica, o fundo apresenta um elevado nível de diversificação, tanto a nível de segmentos como de perfis de rentabilidade esperada. Sabemos que 2021 será um ano peculiar; mesmo assim, o crescimento dos lucros do fundo deverá rondar os 20% em 2022 e estimamos que a percentagem venha a ser semelhante nos anos seguintes, com base na mesma carteira.

Crescimento do lucro por ação médio ponderado do Sycomore Eco Solutions (estimativa)

20212022
30%20%
O fundo não garante o capital investido nem qualquer remuneração.

Como tem sido a alocação da carteira desde o início do ano?

No início de 2021, decidimos diminuir a nossa exposição a empresas especializadas em energias renováveis, pois as valorizações eram bastante altas: as cotações estavam a subir a um ritmo superior ao da capacidade garantida, por isso, as valorizações estavam a descontar um crescimento estimado cada vez mais distante, com margens de erro cada vez maiores. Ainda que seja bastante provável que os gigawatts implicados sejam efetivamente instalados, alguns parâmetros, como o preço da eletricidade, a rentabilidade, a solvência das contrapartes ou a duração dos contratos, são mais incertos depois de 2030.

Por isso, optámos por reforçar outras temáticas, como a construção (Wienerberger, Saint-Gobain, Owens Corning, Sika), a economia circular (Véolia Environnement, Biffa, Aurubis) e os fornecedores de componentes elétricos (Rexel, Nexans), que são de natureza mais cíclica e oferecem valorizações muito mais razoáveis, sobretudo tendo em conta o potencial de recuperação de 2021 e o apoio que estes setores vão receber no âmbito do Plano de Recuperação.

Estes movimentos, levados a cabo dentro do setor ambiental (que vai muito mais além das empresas de renováveis), contribuem para que o nosso perfil de rentabilidade se diferencie do dos ETF durante correções de mercado, como a que vivemos recentemente. Enquanto alguns ETF sofreram perdas de quase 15% desde o início do ano até ao momento, o Sycomore Eco Solutions manteve-se em terreno positivo e ganhou 7,5% no mesmo período (índice**: +8,9%). A cinco anos, o fundo rendeu mais de 11% em termos anualizados (índice**: +7,92%).

Ainda existem oportunidades nas renováveis?

Acreditamos que sim. O reequilíbrio dos índices gera oportunidades, mas o segredo é sermos seletivos. As valorizações do hidrogénio, que ficou muito na moda, são difíceis de justificar. Assim, optámos por um posicionamento indireto na carteira através do investimento em empresas da cadeia de valor do hidrogénio, como as que fabricam células de combustível ou reservatórios (a Plastic Omnium, por exemplo).

Qual é a melhor forma de posicionar a carteira seguindo critérios ambientais?

A transformação verde já começou e já não é possível voltar atrás. Não há dúvida de que os investidores devem ter uma exposição a este setor, mas não de qualquer forma. No que diz respeito às questões ambientais, somos defensores acérrimos das abordagens de investimento ativas. O setor continua a estar relativamente concentrado, mas vão chegando cada vez mais empresas ao mercado: as empresas históricas estão a transformar os seus modelos de negócio e as especializadas estão a entrar em bolsa.

O objetivo da gestão ativa, no âmbito de uma estratégia de sustentabilidade, é discriminar as empresas que vão conseguir manter-se como líderes e continuar a ganhar quota de mercado e a gerar lucros das que simplesmente contribuem para a tendência bolsista.

Durante as correções de mercado, como a vivida ultimamente, é importante identificar as ações que ofereçam pontos de entrada interessantes e que nos permitam investir para os próximos cinco anos, uma vez que nunca adotamos uma abordagem a curto prazo.


*Fontes: IEA, Fieldtrip Kepler.

**MSCI Daily Net Total Return Europe. Fonte: Bloomberg, 1 de abril de 2021.


As rentabilidades passadas não são garantia de resultados futuros. O fundo não garante o capital investido nem qualquer remuneração. O comportamento do fundo pode ser explicado, em parte, pelos indicadores ESG das ações da carteira, mas estes não determinam por si só o comportamento do fundo. As opiniões e estimativas apresentadas traduzem o nosso critério e podem mudar sem aviso prévio, assim como as declarações relativas às tendências dos mercados financeiros, que se baseiam nas condições de mercado atuais. Apesar de considerarmos as informações fornecidas fiáveis, estas não são exaustivas. Os dados e as previsões foram calculados ou elaborados com informações públicas que consideramos fiáveis. Não obstante, não verificámos essas informações de forma independente. Note que qualquer previsão tem as suas limitações, pelo que a SYCOMORE Asset Management não garante que estas previsões se cumpram.