Sérgio Silva (Golden WM): “2023 será caracterizado por uma deterioração nos mercados acionistas seguida de uma alteração da atitude dos bancos centrais”

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Sérgio Silva. Créditos: Cedida (Golden WM)

TRIBUNA de Sérgio Silva, diretor de Investimentos, Golden Wealth Management.

Tal como antecipado para 2022 o grande tema foi a inflação. Esta teve um impacto transversal do ponto de vista dos mercados, mas é bom notar que essa tendência de subida de taxa de inflação já vinha de 2021 e recorde-se que, de forma errada, os bancos centrais foram relutantes a considerar que isso era um problema dando-lhe um caráter de transitoriedade.

Quando entramos em 2022 essa tendência continuou e tivemos aqui um grande acelerador que foi a guerra entre a Rússia e a Ucrânia tendo tido um impacto direto no conjunto das matérias-primas, desde a energia, agrícolas aos metais de base o que simplesmente reforçou essa tendência levando os principais Bancos Centrais a encetar uma política agressiva de subidas da taxa de juro de referência. Tal mudança de atitude e discurso acabaria por ter um impacto negativo muito significativo em termos de mercados.

Terminamos um ano de 2022 com as obrigações do tesouro da zona euro com quedas superiores a 18% equiparado aquele que foi o resultado ao nível das ações. e chegamos ao final de 2022 com um falhanço total daquela que era a carteira balanceada entre ações e obrigações. Ou seja, um investimento de 60% ações e 40% obrigações resultou em 2022 na pior rentabilidade desde 1928.

Esperamos que o ano de 2023 seja bastante desafiante com muitos fatores de risco e muitos temas. Desde logo aqueles que nos acompanharam já em 2022 e aqui estão apenas alguns: temos a possibilidade da continuação da crise energética, a guerra Rússia Ucrânia, a questão da inflação, a questão da recessão e a atuação dos bancos centrais, o tema da China enfim, um conjunto de fatores que poderão impactar o ano de 2023.

Desse conjunto destacamos três sendo um deles desde logo a recessão, a inflação e a postura dos bancos centrais.

Quando os indicadores da atividade global se encontram abaixo de 50 sinalizam que a economia está numa situação de contração que é exatamente o que se está a verificar, quer a nível global quer a nível individual, em particular para os Estados Unidos e para a Europa.

Outro indicador é a inversão da curva de rendimentos, ou seja, a yield a 10 anos assumir um valor inferior à yield a dois anos dando origem a uma inclinação negativa da curva de rendimentos. Esse indicador previu todas as recessões, nunca se tendo verificado um falso positivo. Mais uma vez esse efeito está presente quer nos Estados Unidos quer na Europa e, portanto, no nosso cenário central destaque para a materialização de uma recessão para o ano de 2023 quer para os Estados Unidos quer para a Europa.

Sobre a inflação: claramente estamos numa tendência de descida  e é expectável que ela continue a baixar. Mas a questão coloca-se ao nível da inflação dos serviços, a inflação core, que ainda continua a níveis elevados e, portanto, julgamos que tenderá a cair, mas de uma forma mais lenta.

Terminaríamos com o ponto fundamental e que vai ditar e marcar o ano de 2023 que é a reação e a postura dos bancos centrais à evolução desses dados.

Neste momento existe uma clara dissonância entre aquilo que é o discurso e atitude dos principais bancos centrais face àquilo que o mercado espera.

Nesse sentido julgamos que o ano 2023 será caracterizado por dois períodos distintos, numa primeira fase poderá haver uma deterioração ao nível dos mercados acionistas para depois, e na sequência de uma alteração de atitude por parte dos bancos centrais, haver uma recuperação deste segmento. Ou seja, perspetiva-se um ano com volatilidade o que requer uma mais uma postura bastante ativa ao nível da gestão de carteiras.

Oportunidades para 2023

Do ponto de vista estratégico julgamos que o nosso posicionamento continua válido. Para identificar grandes oportunidades de 2023:

  1.  A questão das obrigações. É bom recordar que há um ano vivíamos num ambiente de taxas de juro negativas na zona euro.  Essa realidade acabou, neste momento já temos taxas bastante positivas e aqui as obrigações podem oferecer bastante valor.
  2.  O tema da China, aliás é um tema que nós iniciamos em 2022 e julgamos que vai ser diferenciador para o ano de 2023.
  3. E terminaria com o complexo dos metais preciosos. Acabamos o ano em que as compras de ouro por parte dos bancos centrais atingiu níveis que já não se viam há décadas e com a possibilidade de haver um travão ao nível da política monetária estão reunidas as condições para o complexo dos metais preciosos, quer os metais quer as empresas de mineração terem um ano excecional.