A abordagem sistemática fundamental da Blackstone para o investimento em crédito

Tim Kasta
Tim Kast. Créditos: Cedida (Blackstone)

Muito diferente de um ETF, mas mais eficiente do que um fundo tradicional é o que a abordagem da Blackstone Systematic Credit propõe no investimento em crédito. “Muitas pessoas, quando ouvem a palavra sistemático, encaixam-nos automaticamente na caixinha quant. É frequente associarem o termo com estratégias opacas, de base estatística, por sinais, fatores… Nós, no entanto, somos investidores sistemáticos fundamentais”, expõe Tim Kasta, co-responsável e diretor-geral sénior desta unidade da Blackstone

Apesar de a casa mãe ser muito conhecida pelo seu papel no investimento em ativos ilíquidos, a Blackstone Systematic Credit apresenta-se com um longo historial na gestão de fundos de obrigações líquidas. Fá-lo com base num modelo fundamental estrutural de risco de default que analisa os emitentes e prevê, frequentemente, eventos de deterioração da situação financeira das empresas que impactam as emissões de dívida. “O nosso modelo prevê, em média, mudanças no risco de incumprimento com, tipicamente, um a três meses de avanço face ao mercado de crédito, e prevê downgrades e risco de incumprimento 18 meses antes das agências de rating”, expõe Tim Kasta. Nos anos 80, com a Incorporação da KMV, a empresa que primeiramente bebeu desta metodologia, o modelo alimentava apenas um sistema de ratings de crédito. Depois da empresa ser vendida à Moody’s, foi criada a DCI - adquirida pela Blackstone e atualmente Blackstone Systematic Credit -, onde o mesmo modelo começou a servir de base à gestão de alguns portefólios de crédito líquidos. Hoje em dia, a oferta vai desde estratégias investment grade a high yield, sem esquecer os mercados emergentes. 

“Apelidamo-nos de fundamentais e sistemáticos. Todas as noites, em São Francisco, corremos os processos de otimização e refrescamos as probabilidades de default de 6.000 emitentes globais”, explica o profissional. Identificam, assim, aqueles nomes que veem a sua situação financeira melhorar e que, em consequência, parecem baratos. São nomes que negoceiam com spreads elevados face ao risco de default que o modelo estima e que o mercado ainda não reflete. Segundo indica Tim Kasta, com base no modelo, a cada momento, cerca de um quarto das empresas no índice investment grade deveriam ser fallen angels

“Todas as manhãs os nossos traders ajustam as posições com base no que o modelo nos diz. E o que faz com que o processo seja sistemático é que ninguém contraria o modelo. Isso é muito importante porque na atividade de investimento estamos sujeitos a muitos vieses comportamentais, muitos erros humanos. Anulamos essa debilidade do processo através da implementação sistemática. O modelo de crédito é fundamental, por isso lhe chamamos abordagem sistemática fundamental”, diz. 

Excluir a empresa do processo

É por isso também que excluem do processo algo que é muito comum nas abordagens mais tradicionais ao investimento em crédito: o diálogo com as empresas e estimativas de fluxos de caixa. “As empresas são a fonte mais enviesada de informação”, exclama. “Aproveitamos a sabedoria coletiva dos mercados de equity, prevendo o risco de default com base em informação fundamental dos balanços, mas principalmente dos modelos de valuation que bebem da informação que emana destes mercados”, diz.

A base de todos os seus processos advém da teoria de avaliação de opções que remonta ao research de Merton, Black e Scholes nos anos 70. “Segundo Merton, poderíamos olhar para as ações como uma call option nos ativos da empresa”. Se os ativos sobem significativamente, grande parte desse valor flui para os detentores de equity. Se os ativos descem, há um limite inferior para o pay-off de que o investidor pode usufruir e os riscos para a dívida, na estrutura de capital, começam a surgir. “É um esquema de remuneração similar a uma opção”, explica. 

Os passos na construção das carteiras

Para construir as carteiras são vários os passos a dar para atingir um resultado equilibrado. Em primeiro lugar, apenas olham para empresas com ações transacionadas em mercado organizado com liquidez suficiente. Corrido o modelo sobre este conjunto, são identificadas aquelas com as emissões de dívida mais desajustadas face ao que o mercado deveria considerar, segundo indica o modelo. Posteriormente, pondera-se cada emissão com base no retorno esperado, com um limite de 2% por emitente. Finalmente, é feito o matching do risco de taxa de juro e risco de spread das carteiras com o benchmark, para que todo o excedente de rentabilidade seja puro alfa. “É por isso que os nossos retornos não são correlacionados. Os investidores escolhem-nos pelo alfa, não pelo beta. O nosso retorno adicional não resulta de assumirmos mais duration ou risco de spread do que o índice de referência. É puro alfa”. 

Uma estratégia que tem provado funcionar, mas que encontra no atual contexto de mercado as condições ideais para funcionar ainda melhor. “Nas nossas estratégias sistemáticas precisamos de três coisas para prosperar: mercados de crédito funcionais, volatilidade e dispersão nos preços de emissões individuais, e, por fim, mercados de crédito que discriminam os fundamentais de crédito subjacentes.” E isto tem-se revelado especialmente verdade nos mercados de crédito high yield em 2022. 

O risco de carbono como engrenagem das estratégias

Para Tim Kasta, a integração de critérios de sustentabilidade foi natural em todo este processo, mas por via de uma das métricas mais quantificáveis. “Convertemos recentemente os nossos fundos UCITS em fundos de baixo carbono. Somos pessoas dos dados. Gostamos de processos que sejam repetíveis e escaláveis. Quando olhamos para os dados ESG vemos muita dispersão entre provedores. Já quando falamos de carbono, vemos uma grande consistência, tanto no scope 1 como scope 2”, explica. É por isso que adotaram as definições da Task Force on Climate-Related Financial Disclosures e incluíram a intensidade de carbono diretamente na otimização do portefólio. “Basicamente, investimos numa carteira diversificada das emissões mais líquidas, com maior desajustamento positivo em termos de avaliação face ao risco de default e com o mesmo beta que o índice e, finalmente, com menos 50% de emissões do que o benchmark. O carbono é uma medida concreta com a qual conseguimos trabalhar”, conclui.