Defender as carteiras com dividendos: três mitos a desmontar

Sam Witherow
Sam Witherow. Créditos: Cedida (J.P. Morgan AM)

Com uma recessão ao virar da esquina e numa fase de grande incerteza devido às tensões que o setor bancário tem sofrido nas últimas semanas, os investidores estão a procurar estratégias para defender as suas carteiras. Com isto em mente, para a J.P. Morgan Asset Management, focar-se em empresas que pagam dividendos parece ser uma opção interessante. Antes de o fazer, porém, é importante dissipar alguns mitos sobre esta classe de ativos.

Contexto favorável para os dividendos

O primeiro mito a desmontar é que, no atual contexto de abrandamento do crescimento, as empresas que pagam dividendos podem estar em desvantagem e perder as suas qualidades defensivas. “Devido ao abrandamento da atividade económica, as empresas estão a perder poder para repercutir as subidas de preços ao consumidor final. E, em geral, é mais difícil defender os lucros. Mas os dividendos são mais estáveis do que os lucros”, afirma Sam Witherow, gestor de carteiras de International Equity Group e cogestor do JPMorgan Investment Funds - Global Dividend Fund, com Rating FundsPeople 2023.

Sam Witherow foi um dos oradores do último Media Summit europeu da gestora, celebrado em Londres no mês passado. “As descidas dos dividendos são sempre menos pronunciadas do que as descidas dos lucros. Trata-se de um fenómeno que também observamos em recessões anteriores”, prossegue o especialista. Além disso, em comparação com a crise financeira de 2008 ou a crise da COVID em 2020, o gestor defende que estamos perante um contexto mais parecido ao da recessão de 2000-2001, quando os dividendos demonstraram ser relativamente resistentes.

Recuperação a partir de níveis baixos

Além disso, os dividendos na atual etapa provêm de um período em que eram muito baixos. “Em 2021-2022, houve um recorde negativo no pagamento de dividendos. Durante a pandemia, as empresas reduziram-nos muito significativamente, com uma queda na sua distribuição de quase 40% na Europa”, continua. Com a recuperação pós-pandémica, houve uma explosão dos lucros empresariais, mas ainda não assistimos a uma recuperação robusta dos dividendos. 

“Na atual fase de incerteza, as empresas ainda se encontram numa posição forte e não pagaram dividendos aos acionistas como fazem normalmente. Os baixos rácios de distribuição proporcionam, portanto, uma proteção para a estabilidade e o crescimento dos dividendos a médio prazo”, afirma Sam Witherow. “Para concluir, embora as expetativas de consenso para o crescimento dos lucros tenham baixado, as expetativas de dividendos permanecem elevadas. As empresas continuam a dizer-nos que num ano em que os lucros irão diminuir, continuarão a aumentar ou a manter os dividendos. Assim, os dividendos podem continuar a desempenhar um papel decisivo nas carteiras”, garante o gestor.

Não só empresas cíclicas

Um segundo mito a dissipar é que investir em dividendos significa exposição a empresas cíclicas com baixas taxas de crescimento. Para Sam Witherow, é importante investir nesta classe de ativos com uma abordagem mais diversificada, que inclua setores que normalmente não são considerados pagadores de dividendos. Isto porque os dividendos seguem tendências estruturais da economia. “Quando se fala de dividendos, pensa-se imediatamente em grandes empresas de setores tradicionais, como serviços públicos, imobiliário e energia. Mas se observarmos a ponderação setorial do índice MSCI ACWI de dividendos absolutos, vemos que as ações financeiras ainda são as que mais contribuem, mas o terceiro maior setor é o tecnológico”, afirma. 

Por isso, o gestor considera importante abordar os dividendos com uma estratégia mais ampla. Incluir também setores que não são tradicionalmente caracterizados pelas políticas de dividendos, como cuidados de saúde, indústria ou o do consumo básico, sem perder a vantagem de participar nas tendências estruturais que se verificam na economia mundial. 

Dividendos vs. obrigações

Por último, outro mito que é preciso dissipar é que o aumento da yield das obrigações tornam as ações que pagam dividendos menos atrativas. De facto, os investidores que procuram rendimentos podem beneficiar de rendimentos regulares assumindo menos riscos.

“As obrigações voltam a ser rentáveis, é certo”, admite Sam Witherow. “Mas também é preciso ter em conta a inflação. Ou seja, o crescimento das yields das obrigações tem de ser visto em termos nominais. As yields das obrigações subiram, mas o cupão das obrigações é fixo e vê-se desgastado pela inflação, enquanto os dividendos das ações beneficiam do crescimento da inflação”, argumenta.

Na sua opinião, com um horizonte de investimento bastante longo, as expetativas de rentabilidade relativa que as ações e as empresas que compram dividendos oferecem são superiores às das obrigações. “Além disso, as valorizações são especialmente favoráveis nestes momentos e as ações de maior rentabilidade são negociadas a taxas de desconto próximas dos seus máximos históricos”, conclui.