Bank run: o que é e por que é tão importante na crise do Silicon Valley Bank

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Créditos: Manki Kim (Unsplash)

O medo de que o caso do Silicon Valley Bank acabe por desencadear um efeito dominó no setor bancário americano é o que os mercados têm descontado nos últimos dias, com quedas diárias nos mercados de ações superiores a 14%.

No entanto, os diferentes especialistas sublinham que, ao contrário do que aconteceu em 2008 com a queda do Lehman Brothers, esta não parece ser uma crise de solvência, mas sim de liquidez, provocada pelo que é conhecido como bank run. Neste Glossário da FundsPeople explicamos o que é.

O que é um bank run?

O bank run não é outra coisa que a fuga de depositantes de um banco por medo que os impeçam de retirar o seu dinheiro. No caso do Silicon Valley Bank (SVB) tudo começou quando o banco recebeu pedidos de reembolso de depósitos que teve de satisfazer através da venda de parte da sua carteira de obrigações com grandes descontos.

Como ocorre?

A palavra-chave para explicar este fenómeno é medo perante a possibilidade de perder as poupanças. No caso do Silicon Valley Bank, “durante os anos 2020 e 2022, recebeu grandes entradas de depósitos por parte de empresas tecnológicas (start-ups) que depositavam os montantes captados nas inúmeras rondas de financiamento realizadas no calor da explosão do Venture Capital. O SVB investiu estas quantidades em ativos de obrigações governamentais norte-americanas a longo prazo (Treasuries) num momento de taxas baixas e, após as vertiginosas subidas da Fed dos últimos meses, acumulavam perdas na valorização das obrigações no seu balanço. Nada importante, senão fosse o facto de as empresas tecnológicas começarem a retirar fundos, primeiro para financiar a sua atividade e, segundo, por medo da viabilidade do banco”, explicam da Welzia Management.

Por outras palavras, essas primeiras saídas de depósitos tornaram-se habituais e, por isso, o banco viu-se obrigado a vender os seus títulos de rendimento fixo com fortes perdas, levando a quedas acentuadas nos seus títulos, o que, por sua vez, desencadeou novos pedidos de reembolsos.

Assim, as autoridades norte-americanas, incluindo o próprio presidente dos EUA, Joe Biden, anunciaram que irão compensar os depósitos acima do limite normal do seguro da FDIC que se situa nos 250.000 dólares (em Portugal, o Fundo de Garantia de Depósitos cobre até 100.000 euros).

O que pode provocar um bank run?

“As crises de liquidez quando afetam os bancos costumam ter consequências muito importantes devido ao efeito de contágio que pode ter noutras entidades financeiras”, explica o Instituto Espanhol de Analistas.

No entanto, até agora, parece que esse efeito de contágio permanecerá mais sob a forma de volatilidade nos mercados de ações do que em novos resgates. Pelo menos, para além dos observados com o SVB, Signature ou os que possam ocorrer com entidades com negócios semelhantes. “Não descartamos a possibilidade das bolsas e do setor bancário continuarem a corrigir, mas não acreditamos que seja um tema sistémico”, explicam desde a Acacia Inversión. 

“A situação atual não é comparável à de 2008, as perdas em ativos de obrigações provocadas pela rápida subida das taxas de juro dos fundos federais afetaram todos os bancos em diferentes graus, mas não colocam em risco os seus requisitos de coeficiente de capital”, afirma Yves Monzon, CIO da Julius Baer.

Mais ainda no caso dos bancos europeus, cujo modelo de negócio é muito diferente do dos bancos da Costa Oeste dos EUA. “Os bancos europeus têm rácios de liquidez mais elevados, acima dos 150%, enquanto o requisito mínimo é 100%”, explica José Ramos Ponferrada, da equipa de aconselhamento e análise da A&G. E acrescenta que outra diferença é que o crescimento dos empréstimos na Europa é de apenas 2-3%, em comparação com os 11% nos EUA. “Por isso, uma maior liquidez e um menor crescimento dos empréstimos justificam que a concorrência dos depósitos seja menor na Europa, o que, juntamente com a estrutura dos balanços dos bancos, reduz o risco de que os bancos europeus se vejam forçados a vender o seu portefólio de obrigações/swaps”, conclui.

No entanto, esta é a teoria, uma vez que, como este artigo nos lembra, o medo pode desencadear diferentes efeitos que acabam por provocar uma crise mais sistémica do deveria ser.

Os bank run mais conhecidos

O caso do Silicon Valley Bank é o mais recente bank run, mas tem havido muitos outros na história e com efeitos muito diferentes. De facto, há até exemplos no cinema, como no filme de Mary Poppins. Quem não se lembra quando Michael, o filho mais novo do Sr. Banks, começa a gritar da janela do banco que não lhe querem devolver o dinheiro, causando o caos entre os depositantes?

Voltando à realidade, segundo relembra Alberto Roldán, diretor da Metagestión numa carta aos investidores, “a primeira grande fuga de depósitos foi em 1907, quando não havia bancos eletrónicos nem fundos de garantia de depósitos como existem hoje, que proporcionam segurança e agilidade às nossas transações. Nessa altura, a fuga de depósitos aconteceu como consequência de um pânico infundado e durou quatro meses. A consequência foi uma depressão que levou a uma queda de 30% do PIB dos Estados Unidos, uma queda maior do que a da Grande Depressão”. 

Após esta chegaram muitas mais - nesta entrada da Wikipedia é possível consultar os casos de bank run mais conhecidos-. Entre elas encontra-se o caso Banesto, em meados dos anos 90, o corralito da Argentina no ano 2000, ou os diferentes episódios que ocorreram durante a grande crise financeira com entidades como a Bear Stearns ou a Nothern Rock, para citar algumas.