O IPC americano e a batalha contra a inflação que ainda não terminou

Inflação
Inflação. Créditos: Florian Klauer (Unsplash)

A inflação americana de dezembro foi mais forte do que o consenso esperava. O Índice de Preços no Consumidor (IPC) subiu 3,4% interanual, acima das expetativas do mercado de 3,2% (novembro: 3,1%). Em termos mensais, o IPC registou uma variação de +0,3% (face a +0,2% previsto).

O índice subjacente (ou seja, excluindo a energia e os produtos alimentares) aumentou 3,9% (previsão do mercado: 3,8%; novembro: +4%). Numa base mensal, o aumento dos preços subjacentes foi de 0,3%, em linha com as expetativas (novembro: +0,3% intermensal). Em consequência, as yields do Tesouro a 10 anos voltaram a ultrapassar o índice em 4% e o índice do dólar subiu. Não obstante, os futuros dos fundos da Fed continuam a prever entre cinco a seis reduções das taxas para este ano, o dobro do que dizem as previsões do FOMC (Federal Market Open Committee).

A descida das taxas vai tardar

Mark Sherlock, responsável de Ações Americanas na Federated Hermes, comentando o possível impacto dos números na Fed, assinala: “A inflação americana esteve acima das expetativas em dezembro, visto que o componente de serviços continuou a exercer uma pressão crescente. Os ativos refúgio continuam elevados e sobem pelo segundo mês consecutivo”.

Isto, reconhece, é dececionante para os investidores que esperavam seis descidas de taxas durante 2024, e sugere que o mercado pode ter exagerado os argumentos para declarar o fim da batalha contra a inflação. A Fed sempre afirmou ser dependente dos dados, dizendo que quer evitar os erros dos anos 70 (quando se baixaram as taxas demasiado cedo e a economia americana sofreu um segundo e mais doloroso ciclo inflacionista). “Os dados de hoje não os vão obrigar a reduzir as taxas rapidamente”, afirma Sherlock.

Richard Flax, diretor de Investimentos na Moneyfarm, está de acordo: “O aumento da inflação geral deverá moderar as expetativas de uma redução iminente das taxas por parte da Reserva Federal, visto que o banco central terá, primeiro, de voltar a situar a inflação dentro do intervalo objetivo de 2% antes de poder abrandar o endurecimento monetário”.

O soft landing continua de pé

Mark Haefele, diretor de Investimentos na UBS Global Wealth Management, aborda o facto do IPC subjacente, que desceu dos 4%, em novembro, para 3,9%, se encontrar no seu nível mais baixo desde maio de 2021. “A inflação dos bens primários manteve-se inalterada em relação ao mês anterior, enquanto os serviços básicos, em particular os custos da habitação, contribuíram mais para o IPC subjacente”, afirma o especialista. Vê indícios, no entanto, de que a inflação continua a abrandar, em linha com o seu cenário base de aterragem suave, embora os mercados, que estão a avaliar uma primeira descida de taxas em março com uma probabilidade próxima de 70%, possam estar a adotar uma visão excessivamente otimista. “Espera-se um abrandamento significativo da política em 2024 e que os mercados continuem otimistas sobre o momento da primeira descida de taxas da Fed”, explica.

Morgane Delledonne, responsável de Estratégias de Investimento para a Europa na Global X, também coloca a inflação subjacente no centro da sua análise. “De modo geral, os números da inflação são mistos, dado o abrandamento do número subjacente e a subida do número principal, o que deixa intacto o status quo”, assinala. “A discrepância entre a Fed e os mercados sobre as perspetivas das taxas poderá persistir ao longo do primeiro trimestre do ano, visto que ambos precisam de ver as suas opiniões confirmadas pelos dados. Entretanto, as perspetivas de taxas de juro mais baixas e um dólar americano mais débil abrem caminho para uma aterragem suave global para 2024, deixando as ações americanas com mais potencial de subida do que as suas homólogas europeias”, conclui.