Ricardo Duarte Silva (CA Gest): “A nossa expetativa aponta para um abrandamento mais pronunciado da atividade económica global em 2024”

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Ricardo Duarte Silva. Créditos: Vítor Duarte

COLABORAÇÃO de Ricardo Duarte Silva, selecionador de fundos da Crédito Agrícola Gest.

A nossa expetativa aponta para um abrandamento mais pronunciado da atividade económica global em 2024. A manutenção de juros elevados e o esvaziamento das poupanças do consumidor norte-americano estão entre os motivos que nos fazem crer que o mercado estará a subestimar a possibilidade de uma recessão moderada no próximo ano. Neste caso particular, acreditamos que o atual soft landing poderá esbarrar no efeito retardado da política monetária mais restritiva do último ano à medida que os agentes económicos (consumidores e empresas) enfrentam custos de financiamento mais altos. Na China, cujo crescimento desiludiu ao longo de 2023, poderemos assistir a alguma recuperação à medida que o mercado imobiliário sara e o governo chinês avança com medidas direcionadas de suporte à economia. Será um período igualmente desafiante com eleições em geografias que representam mais de 50% do PIB mundial.

As classes de ativos melhor posicionadas para enfrentar 2024

No caso das obrigações soberanas, mesmo estando taticamente mais defensivos depois do rally de novembro e dezembro, consideramos que é a classe que melhor relação risco/retorno confere à dobragem do ano. A zona curta da curva permanece atrativa e as zonas intermédia e longa deverão permanecer suportadas, em particular num cenário de recessão. Já as ações e o crédito, permanecem algo dispendiosas em termos relativos. Os múltiplos de mercado, em particular os dos mercados norte americanos, não descontam qualquer probabilidade a uma deterioração mais pronunciada da atividade económica no próximo ano. Já as commodities, poderão continuar a assumir um papel importante em termos de diversificação das carteiras. A recente quebra da correlação entre ações (a máximos) e commodities (em queda liderada pelo complexo da energia) tem sido monitorizada de perto.

Risco de mercado e o segmento obrigacionista

O risco de mercado deverá continuar a centrar a nossas atenções, numa envolvente desafiante em termos geopolíticos e com uma divergência significativa entre expetativas dos investidores e discurso dos bancos centrais.

Sem recomendar um fundo específico, privilegiaríamos o segmento obrigacionista. Na atual envolvente, já somos pagos para permanecer com uma alocação defensiva e nesse sentido as obrigações voltaram a reconquistar o seu espaço. Seguimos cautelosos no que toca ao risco de crédito (spreads seguem a mínimos de 2023) e ao risco de mercado (ações antecipam crescimento de resultados incompatível com um cenário de crescimento económico débil).

A evolução da inflação e das taxas de juro 

Antecipamos que a inflação permaneça numa trajetória descendente, quer a 12, quer a 24 meses, muito embora o recente tailwind (vento a favor) dos custos energéticos se possa rapidamente tornar um headwind (vento contrário). É provável que o mercado se tenha excedido ao antecipar uma queda tão rápida da inflação para os targets estatutários dos principais bancos centrais. Cremos que a convergência rumo aos 2% se fará, a partir de agora, a um ritmo manifestamente mais lento, o que terá repercussões nas expetativas descontadas nos mercados.

Temas de investimento

Os investimentos temáticos em inteligência artificial, digitalização e alterações climáticas suscitam interesse numa perspetiva de longo prazo. No curto prazo, conforme referido, seguimos algo cautelosos relativamente aos temas que conduziram de sobremaneira o rally acionista de 2023. É impressionante a divergência de performance entre as maiores empresas tecnológicas norte-americanas e as empresas de menor dimensão. A mesma dispersão pode ser encontrada entre sectores e países.