Os ventos favoráveis que sopram pelas ações europeias 

pequeno almoço generali
Almudena Mendaza, Francisco Louro, Luis Sancho e Guilherme Neves. Créditos: Vítor Duarte

Apesar do foco mediático estar frequentemente nos mercados de ações do outro lado do Atlântico, as boas empresas não são um exclusivo do mercado norte-americano. São muitos os argumentos que sustentam uma diversificação da alocação com o investimento no velho continente. Numa discussão organizada pela FundsPeople e promovida pela Generali Investments, falou-se de alguns riscos, mas principalmente das oportunidades que uma abordagem seletiva de investimento em ações europeias pode proporcionar aos investidores.

Almudena Mendaza, responsável de Vendas na Generali Investments, vê resiliência nas empresas europeias. Como relembra, muitas das expetativas apontavam para que, com a subida das taxas de juro, as empresas em geral iriam sofrer, especialmente mais na Europa do que nos Estados Unidos. “Todos estavam à espera de um pouco de instabilidade. No entanto, o que os resultados mais recentes nos estão a mostrar e o que muitos players na indústria estão prevêem é que as empresas europeias estão e vão continuar a comportar-se muito bem”, diz.

Não obstante, não acredita que os índices reflitam esta resiliência e destaca a importância de analisar e selecionar as empresas a investir de forma seletiva. “É verdade que os riscos geopolíticos existem e a Europa não está insulada dos mesmos, mas no final do dia, se analisarmos empresa a empresa, encontramos negócios muito inovadores e interessantes para investir”. Esta inovação, para Almudena Mendaza, existe muito mais além do setor tecnológico, sendo que o exemplo que aponta é mesmo um dos setores mais clássicos: o setor bancário. "Muitos bancos na Europa prepararam bem o terreno para que a inteligência artificial, por exemplo, traga a inovação aos seus modelos de negócios", explica. 

Confrontado com a questão sobre os riscos globais que as ações europeias enfrentam, Guilherme Neves, gestor na Invest Gestão de Ativos, releva questões como a guerra no leste da Europa, que ainda é um tema com impacto, ou “a desaceleração geral e a transformação da economia alemã”. Neste último ponto ressalta a “importância de a principal economia europeia se adaptar às transformações na cadeia de abastecimento”, e acrescenta um outro fator que afeta as economias desenvolvidas de uma forma transversal e que “poderá vir a ser um problema”: a crescente dívida global. Contudo, tal como Almudena Mendaza, vê valor em ações individuais cujas características as tornam atrativas, apesar dos riscos que pairam sobre a economia. "Encontramos investimentos interessantes em países como a Holanda, a Dinamarca e a Suíça, por exemplo. Mas eu não excluiria uma empresa pelo país. Não é um critério. O importante, isso sim, é encontrar empresas que negociem a um nível razoável, com balanços sólidos, baixo endividamento, possibilidades de crescimento e boa alocação de capital", atesta.

Já no que diz respeito à capitalização de mercado, o gestor destaca que há muitas pequenas empresas europeias com as caraterísticas que aprecia. "Há definitivamente algumas small caps interessantes na Europa. Claro que algumas não são investíveis devido à liquidez, mas ainda assim eu destacaria algumas small caps que por vezes até se encontram em melhor forma do que as large caps no EuroStoxx 50".

Luis Sancho, responsável de Investimentos na BBVA AM, por seu lado, enfatizou um outro ponto crucial: nos últimos dois anos e depois de muito tempo, “as empresas europeias conseguiram finalmente aumentar os preços de bens e serviços mitigando simultaneamente o aumento do custo dos seus inputs de produção”. E o profissional considera que este é um “sinal muito positivo para as perspetivas das empresas”. Refere também que “muitos dos ventos contrários que afetavam as empresas europeias se têm diluído ou revertido”, exemplificando com os preços da energia – da eletricidade e do gás em particular - que estão bem abaixo dos picos atingidos há um ano e meio.

Credenciais ESG são um ponto positivo

Luis Sancho acredita que as empresas estão muito bem posicionadas para tirar partido de determinados aspetos que serão cruciais nas economias europeias. Especificamente, destaca a sustentabilidade. “Na Europa as empresas têm muito melhores credenciais ESG do que nos Estados Unidos. Temos muitos projetos de transição energética e isso vai implicar muito investimento nos próximos dois ou três anos. É um volume de investimento que pode transformar a Europa como um todo e uma história que suporta o investimento em empresas europeias”, diz. "Num horizonte temporal de longo prazo, as credenciais ESG e o melhor perfil de risco e retorno que daí advém podem resultar em melhores valorizações".

Francisco Louro, diretor de Investimentos na Bluecrow trouxe, na mesa redonda, uma perspetiva mais particular ao abordar as pressões geopolíticas que a Europa enfrenta. Ao contrário de vê-las apenas como ameaças, sugere que, em algumas circunstâncias, possam ser vistas como oportunidades. "Penso que estas pressões geopolíticas que a Europa está a enfrentar, como a guerra e o ressurgimento de Trump, que quer deixar a Europa entregue a si mesma - e posso ser controverso com isto -, mas pode ter o seu lado positivo", diz.

Como argumenta, estes momentos geopolíticos desafiadores podem ser grandes catalisadores de mudanças positivas, em que historicamente são feitos enormes investimentos em tecnologia e industria, que levam a transformações de uma escala que não vemos há muito tempo. "É evidente que como cidadãos não queremos ver os estados a investir em defesa. É um mau sinal. Mas é exatamente em momentos como o atual que se lançam muitas sementes para o progresso futuro. Vemos isso, por exemplo, como resultado da necessidade de os países acelerarem a transição energética, como o estão a fazer, para combater a dependência da Rússia. Este movimento pode ser um forte vento favorável para as empresas europeias no longo prazo", diz. “Na história, estes momentos definiram os grandes saltos em frente para a Humanidade, para a tecnologia e para os próprios estados. Obviamente, nenhum de nós quer ver Vladimir Putin a invadir outro país, mas a verdade é que o medo, dessa hipótese, pode ser um grande motivador para a evolução, para a flexibilidade e para o investimento em tecnologia que a Europa tanto precisa”, conclui.