O termo não é exatamente novo, mas tem ganho maior destaque nos últimos anos, tendo em conta a crescente importância que tem sido dada às questões da sustentabilidade, pela sociedade em geral. Trata-se do termo, em inglês, greenwashing. Esta é uma expressão que apareceu pela primeira vez na década de oitenta, numa publicação de uma revista britânica, onde se fazia a analogia entre greenwash, lavagem verde, com brainwashing, lavagem cerebral. A partir daí, o termo começou a ganhar notoriedade. É utilizado para descrever práticas de marketing ou comunicação por parte de empresas, organizações ou produtos que fazem alegações enganosas ou exageradas sobre o seu impacto ambiental ou compromissos com a sustentabilidade.
De acordo com um estudo publicado no final de 2023 e conduzido pela ESMA, durante 2020 e 2021, 70% dos incidentes relativos à comunicação enganosa das empresas que compõem o índice STOXX Europe 600 foram relacionadas com greenwashing. Naturalmente, o intuito, intencionalmente ou não, é projetar uma imagem de responsabilidade ambiental sem realmente implementar práticas sustentáveis significativas.
As causas
São várias as razões que estão por detrás deste tipo de conduta. Na opinião de Álvaro Antón Luna, responsável de negócio para a Península Ibérica da abrdn, o crescimento desta prática poderá ter que ver com o facto da sustentabilidade se ter tornado “um grande negócio”, e também pelo facto de as empresas “enfrentarem uma maior pressão para comunicarem os seus relatórios ambientais a um público cada vez mais exigente”. Essa exigência e pressão do lado empresarial pode conduzir a práticas enganosas quando se trata de competir particularmente por consumidores ou investidores mais sensíveis a certas temáticas e pelo desejo de melhorar a reputação da marca. Além disso, essas alegações enganosas de sustentabilidade podem ser usadas para justificar preços mais altos dos produtos face aos concorrentes.
Outras das causas poderá ser a falta de regulamentação eficaz, clara e rigorosa sobre declarações ambientais e de sustentabilidade, permitindo que as empresas atuem fora dos padrões éticos sem enfrentar consequências significativas, possibilitando assim o greenwashing. Também a desinformação ajuda na difusão desta prática. Algumas empresas podem fazer publicidade enganosa, de forma não intencional, devido a uma compreensão inadequada dos conceitos de sustentabilidade ou à falta de definições claras e padronizadas sobre o que constitui realmente uma prática ambientalmente responsável.
Do lado dos gestores de ativos, a pressão por captar mais volume de ativos pode levar alguns gestores a serem tentados a promover produtos financeiros como sustentáveis, mesmo que tal não seja uma prioridade genuína. Por outro lado, a complexidade das métricas ESG pode, também, não transmitir clareza suficiente quanto à posição efetiva de uma determinada empresa nessa matéria, levando a decisões de investimento que não são totalmente informadas ou alinhadas com os objetivos de sustentabilidade dos investidores.
Como pode ser identificado?
Focando no campo da gestão de ativos, há vários sinais a que os investidores em fundos devem prestar particular atenção. Primeiramente, é fundamental fazer uma pesquisa detalhada sobre o produto e verificar se a conduta está alinhada com a filosofia descrita. Se o fundo se define como sendo de cariz sustentável ou que integra características de sustentabilidade e ESG, tal terá que estar explicito nos documentos informativos, bem como nos pré-contratuais. Assim, é importante procurar como é feita a integração de critérios ESG, o processo de seleção de ativos e que tipo de metas e compromissos foram estabelecidos nesse campo, por exemplo, no que respeita à transição energética ou à descarbonização. Outros elementos a ter em conta são o engagement que é feito junto das empresas, os fatores de exclusão, o alinhamento com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) - caso seja anunciado pelo fundo - ou mesmo que tipo de iniciativas, programas ou certificações estão presentes.
Em termos de indicadores específicos, uma das primeiras que estes investidores privilegiam é a classificação SFDR. Ainda que seja necessário, não deverá ser o único fator de decisão, quando se pretende fazer uma escolha de cariz sustentável. Em setembro de 2023, a Comissão Europeia lançou um processo de consulta exaustiva sobre o Regulamento SFDR e uma das preocupações apontadas foi, precisamente, uma certa banalização do uso dos artigos 8º e 9º como rótulos de produtos sustentáveis. Tal prática pode contribuir para aumentar os riscos de greenwashing. Outras métricas a que importa estar atento pela sua pertinência são a gestão de resíduos, eficiência energética, emissões de carbono, investimento em combustíveis fósseis e o tipo de envolvimento por produto, e verificar se a descrição do fundo está em linha com os valores mostrados.
Por último, para que investidor faça escolhas informadas pode ser necessário procurar consultoria profissional especializada em investimentos sustentáveis.
Como pode ser combatido?
Há diversas entidades que têm atuado no combate ao greenwashing. Vão desde organizações não governamentais de defesa do consumidor ou ambientais, a agências reguladoras de mercados financeiros, como é o caso da ESMA, até à Comissão Europeia. Nem todas têm o mesmo poder de atuação e no caso das ONGs, as ações incidem sobretudo na identificação, monitorização e denúncia destas práticas.
A ESMA, por sua vez, desempenha um papel determinante na regulamentação e supervisão de produtos de investimento para garantir que sejam comercializados de forma transparente e, portanto, que a informação sobre sustentabilidade seja precisa. No seu Sustainable Finance Roadmap para o período de 2022-2024, foi definido o combate ao greenwashing como uma das suas prioridades, por ser “um problema complexo e multifacetado que assume várias formas, tem diferentes causas e tem o potencial de afetar negativamente os investidores que procuram realizar investimentos sustentáveis”. Nas suas diretrizes recentemente publicadas, comprometeu-se igualmente a regulamentar a designação dos veículos que se afirmam sustentáveis.
No caso da Comissão Europeia, que é responsável por formular políticas e legislação, várias têm sido as medidas aplicadas, particularmente para fazer frente a esta problemática. Uma das últimas, divulgada já em 2024, é a “aplicação de sanções que incluem a exclusão de contratos públicos, o confisco de receitas e uma coima de 4% do volume de negócios anual” sobre empresas onde sejam identificadas práticas de greenwashing. Além disso, um dos principais pontos onde a Comissão Europeia tem atuado de forma insistente é na proibição do uso indevido de rótulos de sustentabilidade. Estes só são possíveis “se baseados em sistemas de certificação aprovados ou estabelecidos por autoridades públicas”.
Do ponto de vista das entidades gestoras de ativos, é importante não só seguir as mais diversas ações e medidas aplicadas pelas autoridades, como elas próprias acompanharem as empresas em que investem, sob a forma de engagement ativo, como a votação em assembleias de acionistas ou diálogo direto, por exemplo. Aderir a certos programas, como os Princípios de Investimento Responsável (PRI) ou alinhar os investimentos com os ODS, pode também ajudar a combater o greenwashing. Isto porque, ao ser parte destas iniciativas, os gestores de ativos demonstram um compromisso claro com o investimento responsável e sustentável, e transparência na integração de critérios ESG, o que pode contribuir para reduzir a incidência de estratégias enganosas em matéria de sustentabilidade nas suas carteiras.