Numa entrevista com a FundsPeople, o diretor-geral da gestora para Espanha e Portugal, analisa as tendências que deteta na indústria, a sua visão sobre o que está a acontecer nos mercados privados e os acordos que a entidade alemã está a estabelecer para ajudar os seus clientes e contribuir para o desenvolvimento do negócio.
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2022 foi um ano muito positivo para o negócio da DWS na Península Ibérica. Ao contrário da tendência geral que a indústria estrangeira de gestão de ativos viveu, a entidade alemã registou entradas líquidas de dinheiro. “Antecipámo-nos muito bem à subida da inflação e à sua persistência. As nossas expetativas foram bem aceites pelo mercado e os fundos que historicamente costumam ter um desempenho ótimo neste contexto, como os da agricultura ou infraestruturas, foram muito bem recebidos. A isto juntou-se o interesse dos nossos clientes por produtos que seguem uma aproximação ao mercado mais conservadora, como os de dividendos, obrigações flutuantes (onde, no último mês e meio, voltamos a ver entradas) ou o DWS Concept Kaldemorgen, que mostrou uma grande resiliência (-4%) face à média de produtos conservadores (-10%)”, recorda Mariano Arenillas.
Mas, segundo o diretor-geral da DWS para Espanha e Portugal numa entrevista com a FundsPeople, as dinâmicas dos mercados mudaram este ano. “O interesse do investidor mudou radicalmente com o regresso das obrigações. Essa potencial desconexão que assistimos entre as ações e os dados macroeconómicos faz com que muitos investidores sejam muito cautelosos com as suas carteiras, dando uma maior ponderação às obrigações. É uma jogada bastante clara. No próximo ano, é possível que o mercado de obrigações ofereça uma rentabilidade muito semelhante à das ações. Tendo em conta o maior risco das ações em relação ao mercado obrigacionista, faz sentido que muitos investidores estejam a dar um maior peso a esta classe de ativos nas suas carteiras”, explica.
Dentro do que é o investimento no mercado de obrigações, a grande questão que muitos dos clientes ibéricos colocam à equipa de vendas é saber qual é a melhor altura para aumentar a duração. “Na DWS, é algo que praticamente não aconselhávamos até há algumas semanas. Antes apostávamos na parte curta da curva e agora a nossa recomendação, para os investidores que querem gerar rentabilidade a dois-três anos, é ir adicionando alguma duração”. A entidade alemã já não prevê mais subidas de taxas. A deterioração dos dados macro e os números do emprego mais fracos são indicadores que fazem pressagiar que o ciclo inflacionista poderá começar a abrandar. De facto, a estimativa da entidade é que a inflação será de 2,5% nos dois lados do Atlântico.
Mudança de paradigma nos mercados privados
Essa mudança de paradigma a que assistiram no investimento em obrigações também se fez sentir nos mercados privados. “É evidente que os investidores institucionais reduziram o seu interesse por esta classe de ativos. Isto deve-se não só às piores expetativas a curto prazo para os ativos ilíquidos, mas também ao efeito denominador, que fez com que, em 2022, o peso que tinham nas carteiras de seguradoras, fundos de pensões e outras aumentasse como consequência da queda do preço das ações e obrigações. Mas onde não se verificou um abrandamento dos ativos privados foi no segmento de wealth management, onde continua a haver procura e a percentagem de investimento ainda é muito baixa, sendo inferior a 3% no caso da banca privada”, destaca.
Segundo Mariano Arenillas, na hora de investir em mercados privados, o timing é importante. “É muito importante apanhar uma boa colheita”, reconhece. E, na sua opinião, é neste momento, com a correção, que é preciso lançar veículos que permitam captar essas oportunidades que geram rentabilidades mais elevadas. “O ativo livre de risco já não está a pagar cupões de 0,5%-1%, mas de 4%. E isto muda por completo o panorama, uma vez que, como gestora, o que temos de oferecer já não são produtos com expetativas de retorno de 8%, mas sim produtos mais agressivos, na ordem dos 12%-13%. De todos os modos, o imobiliário, as infraestruturas, o private equity ou o crédito privado não só continuam a fazer sentido devido a estas expetativas de rentabilidade mais elevadas, como também devem ser vistos como estratégias que permitem reduzir o risco da carteira”, sublinha.
Neste sentido, Mariano Arenillas também salienta a necessidade de formação. “A transformação europeia vai gerar muitas oportunidades de investimento muito boas. Como gestora, estamos empenhados em canalizar a poupança dos clientes para veículos que investem em aspetos como a digitalização ou a transição energética da Europa, para que esta possa competir com os Estados Unidos e Ásia. Mas falta formação. Por isso, assinamos um acordo com a Universidade de Frankfurt para realizar estudos que permitam identificar como devem ser realizadas estas iniciativas de investimento publico-privadas. Ou com a Cátedra de Asset Management da ICADE para realizar estudos sobre como tornar este novo conceito de investimento mais digerível para o investidor final. Algumas ideias são mais simples, mas tornam-se tão complexas que é difícil fazê-las passar”.
As perspetivas da casa são de que o investimento em mercados privados cresça nos próximos anos a um ritmos de 10%. É a mesma percentagem de crescimento que preveem para a gestão passiva. “Com as expetativas regulamentares em cima da mesa para os próximos 24-36 meses, a deterioração da margem que muitas instituições financeiras vão sofrer será cada vez mais palpável. Isto fará com que, para tentar oferecer preços mais baixos ao investidor final, a gestão passiva cresça. Tanto na Europa como na Península Ibérica, o rácio de presença entre os produtos de gestão passiva e os de gestão ativa está ainda muito longe do atingido nos Estados Unidos, onde já representam metade dos ativos. Esperamos que o mesmo rumo se mantenha aqui”, antecipa o diretor-geral da DWS para a Península Ibérica.
A indústria tende para a especialização
Para Mariano Arenillas é evidente que o mundo empresarial tende para a especialização, algo a que a indústria de gestão de ativos não é alheia. “Há entidades que se dedicam exclusivamente ao asset management e que terão de crescer ou morrer. Outras, por sua vez, apresentam características diferentes, o que significa que o seu crescimento não virá da gestão de ativos, mas do conhecimento que têm do cliente final. Todas as entidades que se dediquem em exclusivo à gestão e que consigam manter a sua rentabilidade vão crescer e as que não consigam manter custos baixos e volumes geridos elevados têm tendência a fundir-se”, afirma. É uma tendência que se verifica a nível global e que afeta diferentes âmbitos sobre como algumas entidades estão a encarar o negócio.
Dá como exemplo a aliança estratégica alcançada em abril pela gestora com a Galaxy Digital Holdings para desenvolver soluções de gestão de ativos digitais na Europa, algo que permitirá desbloquear o acesso dos investidores ao crescente universo de blockchain e dos ativos digitais, como o caso das criptomoedas. Ou também a possibilidade de tokenizar alguns dos fundos da DWS, para que os seus clientes possam trocar euros físicos por euros digitais sem qualquer tipo de entrave, com o mesmo resultado de comprar o fundo digital ou o físico. “Somos especialistas em gestão, não em temas digitais. Aí procuramos alianças com empresas especialistas na matéria, que tenham esse conhecimento. Este tipo de joint venture serão cada vez mais habituais. Fazermos nós mesmos é basear-nos num modelo antigo”, conclui.