Por que razão os emitentes de CoCos terão de pagar cupões mais altos?

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Créditos: Raul Petri (Unsplash)

O cancelamento dos AT1 do Credit Suisse a 19 de março penalizou todo o mercado de CoCos na Europa, fazendo aumentar o prémio de risco dos AT1 em 500 pontos base (5,00% de yield to call) a 6 de março, para mais de 750 pontos base (7,5% yield to maturity) a 20 de março. Desde este pico, os spreads tenderam a diminuir, embora continuem voláteis. O aumento dos spreads traduz-se agora em yields mais elevados neste segmento de mercado. “A yield para a data primeira possível de amortização situa-se entre os 10% e os 11%, enquanto as yields até à maturidade estão entre os 8% e os 9,5%”, revela François Lavier, responsável de Dívida Financeira Subordinada na Lazard Frères Gestion.

Sim, os emitentes terão de pagar, em média, cupões mais elevados nas suas obrigações AT1 CoCo, mas não devido ao que aconteceu às obrigações do Credit Suisse, nem por terem de atrair investidores. Este segmento do mercado difere das habituais obrigações de investment grade ou de high yield em termos de padrões de emissão e refinanciamento.

Características específicas dos CoCos

Tal como explica Jérémie Boudinet, responsável de Crédito Investment Grade da La Française AM, os CoCos AT1 bancários estão sujeitos a uma supervisão regulatória específica e têm de cumprir várias especificações rigorosas das cláusulas das obrigações. Além disso, cada banco tem uma quantidade máxima de obrigações AT1 a emitir, fixado pelo seu regulador. Caso o banco não consiga otimizar o equilíbrio do seu cabaz de obrigações AT1, o défice de capital regulamentar tem de ser coberto por capital ordinário (isto é, ações ordinárias). “Assim, o mercado de CoCo AT1 na Europa já alcançou mais ou menos a sua dimensão máxima, com apenas algumas exceções para os bancos pequenos, e praticamente toda a nova oferta se destina a substituir as obrigações existentes”.

Segundo o especialista, a maioria dos cupões de obrigações AT1 denominados em euros no momento da emissão são fixados em: taxa swap atual a cinco anos + spread. “Estas obrigações são perpétuas, mas beneficiam de uma primeira data de amortização (não antes de cinco anos após a emissão) e de datas de amortização subsequentes que dependem das condições finais da emissão (a cada três meses, semestralmente, anualmente, a cada cinco anos, ...). Se um banco não pode resgatar a sua obrigação AT1, a nova fórmula do cupão é reajustada na data do possível resgate para: nova taxa swap a cinco anos + o spread inicial na emissão (também conhecido como spread de reajuste) até à próxima data de call/reajuste”. 

Spread de reajuste

Uma opção de amortização na primeira data de call só pode ocorrer se tiver sido aprovada pelo regulador do banco (o BCE, por exemplo), com a condição de que (i) as obrigações a resgatar tenham sido refinanciadas antecipadamente e que (ii) este refinanciamento tenha ocorrido a um custo semelhante ou mais barato para o emitente. A definição de custo semelhante é deliberadamente vaga, mas depende de uma métrica específica: o spread de reajuste. “Um banco vai refinanciar o seu próximo CoCo AT1 resgatável apenas se puder fixar o preço de um novo a um spread semelhante ou inferior. Os cupões não são realmente importantes per se, uma vez que os bancos normalmente trocam as suas emissões de taxa fixa por outras de taxa variável, pelo que o spread é o principal parâmetro para tomar uma decisão deste tipo”, assinala Jérémie Boudinet. 

Em janeiro, vários emitentes acorreram ao mercado para refinanciar algumas das suas próximas emissões, como o Banco Sabadell, que emitiu um novo CoCo com um cupão de 9,375% (taxa swap a cinco anos no momento da emissão + spread de 683 pontos base) para amortizar a sua obrigação AT1 resgatável de 8,735% em fevereiro, apesar do spread deste último ser inferior (605 pontos base).

Consequências

“Numa maior escala, os emitentes terão sem dúvida de pagar cupões mais elevados pelos seus CoCos AT1 nos próximos trimestres, ou porque não são resgatados e reajustados com cupões mais elevados (mas com o mesmo spread), ou porque poderão refinanciá-los com um spread equivalente ou inferior, mas ainda com uma base de taxas mais elevada do que no passado (a taxa swap atual a cinco anos era de 3,05% no final de março de 2023)”, afirma o responsável de Crédito Investment Grade da La Française AM.

Em conclusão, de acordo com a sua tese, é expetável que se exerçam menos call options no mercado de AT1, mas isto não significa que o seu carry possa diminuir, uma vez que os cupões se irão reajustar naturalmente a níveis mais elevados graças à base de taxas swap mais elevada.

Fonte: La Française AM. Bloomberg. Dados a 31 de março de 2023.