As seis mudanças revolucionárias que estão a chegar ao setor de wealth management

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Créditos: Susan Q Yin (Unsplash)

O setor de wealth management encontra-se numa fase de rápida expansão e crescimento. E também de transformação. Iván Pascual sabe-o bem. Na sua qualidade de responsável pela iShares e pelo negócio de Wealth para a região EMEA, tem acompanhado de perto as mudanças estruturais que estão a ocorrer nos modelos de negócio neste segmento. As entidades de wealth management estão a redefinir a sua proposta de valor para o cliente de uma forma mais acelerada. "A mudança na proposta de valor está a afetar toda a estrutura da entidade, desde a componente humana, a abordagem a produtos, até aos aspetos mais técnicos (tecnologia...)", sublinha.

Numa entrevista à FundsPeople, Pascual assegura que nunca houve tanto dinheiro em circulação na história da indústria europeia de wealth management. Este facto, na sua opinião, não só se traduz em grandes oportunidades para o desenvolvimento do negócio de wealth management como também é uma grande oportunidade para a indústria da gestão de ativos.

As gestoras de fundos estão a passar por um importante processo de redefinição para se adaptarem às mudanças no setor de wealth management. Como explica, o denominador comum é dar prioridade a uma proposta de valor centrada no cliente, ao passo que, até à data, tem sido centrada no produto. Isto implica grandes mudanças no modelo de negócio das entidades de wealth management, que, por sua vez, enfrentam mudanças que irão revolucionar os seus modelos de negócio e a forma como abordam os seus clientes. Mais em concreto, Pascual identifica seis mudanças.

1. O planeamento financeiro como objetivo central da proposta de wealth management...

Esta é, talvez, a mais relevante, pela mudança de mentalidade que implica. "Trata-se de passar de um modelo baseado na venda de carteiras ou produtos para um modelo baseado no conceito de planeamento financeiro", destaca. Na prática, isso significará determinar como estruturar a alocação de capital do investidor ao longo do tempo, de modo a que este atinja os seus objetivos financeiros ao longo da sua vida.

"É uma evolução na forma de aconselhar o cliente" que, segundo o especialista, "implica uma grande mudança para a entidade no ponto de vista dos processos e da cultura, o que implica investimentos importantes em tecnologia, a redefinição e simplificação da oferta de produtos, bem como uma evolução no modelo de relação com o cliente final. O setor de wealth management está a avançar nesta direção porque estabelece uma boa ligação com o cliente e este tem mais facilidade em investir”.

…que se irá estender a segmentos mais retail

O conceito de planeamento financeiro está muito mais desenvolvido no segmento ultra high, em que, de acordo com as suas estimativas, entre 70% e 80% dos clientes de banca privada já dispõem de tais serviços. No entanto, no segmento de retalho, Pascual estima que apenas 14% dos clientes têm acesso a algum tipo de planeamento financeiro. "O conceito de planos de poupança com ETF é uma ideia que gira em torno disto. As receitas do conceito de planeamento financeiro irão crescer na Europa nos próximos cinco anos a taxas superiores a 20%. Trata-se de um modelo escalável que pode ser uma fonte de receitas muito importante para o setor de wealth management", prevê.

"Pela primeira vez na história do setor de wealth management, o cliente está a ser colocado no centro da proposta de valor, procurando compreendê-lo melhor para o ajudar a atingir os seus objetivos financeiros. A proposta de valor está a passar de uma fase centrada na venda de produtos para uma fase baseada na construção de carteiras e, a partir daí, para um futuro em que se centrará no conceito de planeamento financeiro. Esta é a grande mudança estrutural a que estamos a assistir no setor, que descreve muito bem de onde viemos e para onde vamos. As instituições que conseguirem o plano financeiro do cliente ficarão realmente com o cliente”.

2. A segmentação de clientes numa nova perspetiva

Para o responsável da iShares e do negócio Wealth na região EMEA, muitos dos grandes projetos estratégicos a implementar no mundo de wealth management passam por mudar o formato da segmentação dos clientes. "Porquê categorizar em função do mínimo disponível e não com base nas necessidades e comportamentos do cliente? Porque é que clientes com o mesmo património devem exigir os mesmos serviços?”, questiona.

Na sua opinião, a segmentação dos clientes através desta nova perspetiva irá levar as gestoras de patrimónios a compreendê-los muito melhor e a responder-lhes de forma muito mais eficiente e eficaz. "Vai provocar muitas mudanças na forma como as redes comerciais interagem com eles, mas não há dúvida de que vai haver uma revolução em tudo o que se relaciona com a sua segmentação de clientes. Essa segmentação está a evoluir para um ambiente de compreensão das necessidades e dos comportamentos dos clientes".

3. A aceleração da transparência dos preços no mundo de wealth management

A evolução do modelo de receitas e comissões vai mudar. De facto, segundo Pascual, já está a mudar. "Vemos cada vez mais a preocupação de nos afastarmos das retrocessões e centrarmo-nos em modelos de cobrança explícita. De maneira geral, isto pode ser abordado de dois ângulos. De um modelo de plataforma de custódia sem aconselhamento ou de outro, baseado em aconselhamento e gestão”.

A nível europeu, Pascual depara-se com o conceito de platform fee, ou seja, cobrar ao cliente X pontos base e dar-lhe acesso a uma vasta oferta de veículos e classes de fundos, sendo este último o que considera mais atrativo para as instituições na Península Ibérica. "Começamos a ver um modelo centrado no financial planning fee, em que o conceito já reflete o valor acrescentado que o serviço proporciona.

Na sua opinião, seria ainda mais interessante para uma empresa de wealth management apresentar ao cliente um modelo orientado para o financial planning fee. "Simplesmente, o conceito já reflete inerentemente o valor acrescentado que lhes estamos a proporcionar, visto que se trata do seu planeamento financeiro. Portanto, seria passar de um modelo de retrocessão para um modelo baseado em comissões de gestão ou de consultoria e, deste último, para um modelo baseado no planeamento financeiro. A implementação deste tipo de modelo é uma tendência clara na Europa", revela.

4. A expansão internacional dos wealth managers

Primeiro foi a expansão dos neobrokers e dos bancos digitais, com plataformas que começaram a atravessar fronteiras. E agora, segundo Pascual, será a vez do mundo de wealth management. "Estamos a assistir, pela primeira vez em muitos anos, a uma expansão incipiente de entidades que tiveram sucesso em alguns países com plataformas tecnológicas que lhes permitem abrir e expandir-se em novos mercados de uma forma muito rápida e eficiente. Trazem uma nova experiência de cliente e serviços muito competitivos em termos de preço. As grandes entidades comerciais estão a reagir e a redefinir as suas ofertas digitais para ativar os clientes que nunca investiram", destaca.

5. Plataformas digitais de wealth para o segmento de clientes de banca privada

A tecnologia e a digitalização não serão apenas fundamentais para a expansão internacional das empresas de wealth management. Será também fundamental para a forma como o setor se vai ligar ao segmento mais afluente da banca de retalho. "Os canais digitais começam a ganhar cada vez mais força com clientes de wealth de 300, 400, 500 mil euros. E fazem-no com um onboarding 100% digital, baseado num modelo de carteira e planeamento financeiro com consultores remotos, que podem responder a perguntas ou resolver as dúvidas dos clientes. As plataformas de digital wealth para este tipo de clientes são uma tendência muito incipiente no setor", identifica o responsável da iShares e do negócio Wealth para a região EMEA.

6. A entrada em ação dos grandes bancos europeus

Os grandes bancos de retalho da Europa estão a reagir rapidamente ao sucesso das plataformas digitais e a lançar projetos para ativar clientes da própria casa que nunca investiram antes. "Os bancos entendem que esse cliente vai procurar este serviço e querem fornecê-lo a partir do banco. Vão tomar medidas, tentando transformar a experiência do cliente. Trata-se de educar mais sobre as razões pelas quais devem investir e não tanto sobre o que têm de comprar".

De acordo com as suas estimativas, a maior parte das entradas de dinheiro através dos canais digitais virá através deste canal, à medida que estas entidades vão aumentando o seu acesso aos clientes. "Seria ilusório pensar que os grandes bancos vão ignorar a relevância que os neobrokers estão a adquirir com as suas plataformas online. É uma tendência que se verificou no ano passado e que se está a confirmar este ano. Vemos um grande interesse nos planos de poupança ETF, um modelo que tem tido muito sucesso em mercados como a Alemanha e os países nórdicos”.

Qual será o modelo vencedor do futuro?

Segundo Pascual, nunca se assistiu a um mercado tão dinâmico em todas as suas dimensões: clientes, produtos, evolução dos modelos de negócio... O que, na sua opinião, irá definir o sucesso dos wealth managers é a rapidez de execução, ou seja, a rapidez com que conseguem reunir estes novos canais de acesso ao cliente". Trata-se de uma profunda mudança de mentalidade, que implica a redefinição da oferta de valor e o alinhamento dos recursos internos. Não sei qual será o modelo vencedor do futuro. Sei que o modelo que está a ganhar agora é aquele que tem um processo centralizado de investimentos, em que o consultor ou banqueiro está capacitado por meios digitais e com o conceito de planeamento financeiro no centro da proposta de valor. Atualmente, é o que mais está a crescer", conclui.