Balanço da crise dos CoCos, seis meses depois

Jérémie Boudinet La Française AM
Jérémie Boudinet. Créditos: Cedida (La Française AM)

Passaram pouco mais de seis meses desde que a crise de confiança na banca regional norte-americana e no Credit Suisse desencadeou uma forte correção na dívida subordinada financeira. As preocupações com a estabilidade do sistema financeiro há muito que diminuíram, mas as dúvidas relativamente às valorizações dos ativos não se dissiparam por completo.

Como estão os fundamentais?

“Contrariamente ao que pode parecer de um ponto de vista externo, a situação dos CoCos normalizou-se com bastante rapidez, uma vez que o desaparecimento do Credit Suisse e de vários bancos norte-americanos não desencadearam uma crise sistémica”, conta Jérémie Boudinet, responsável de Dívida Investment Grade da La Française AM. Como bem salienta o gestor do La Française Sub Debt, todos os emitentes têm estado a amortizar e a refinanciar as suas obrigações e o interesse pelas novas emissões é grande, uma vez que apresentam cupões elevados (por exemplo, a Abanca com um cupão de 10,625% no seu novo CoCo).

A liquidez também não tem sido um problema, afirma o especialista, uma vez que os CoCos continuam a negociar de forma mais eficiente do que a maioria das obrigações corporativas high yield. “A oferta não é realmente um problema, uma vez que este segmento está agora maduro em termos de dimensão, e os bancos só vêm refinanciar as obrigações existentes”, defende. 

No entanto, Jérémie Boudinet reconhece que a procura diminuiu após o desaparecimento do Credit Suisse. Foi o caso, em particular, da Ásia, onde os CoCos eram vendidos diretamente a clientes de retalho endinheirados. “Os hedge funds não demoraram a preencher o vazio e a obter o produto, mas continuamos a aperceber-nos da falta de entusiasmo por parte dos investidores institucionais, que se mantêm um pouco à margem e se abstêm de aumentar as suas posições”, afirma. 

O que dizem as valorizações

Além disso, sente que a elevada volatilidade das taxas de juro oficiais e dos mercados de obrigações em geral também não ajuda, uma vez que, atualmente, os participantes no mercado preferem obter um carry mais baixo na dívida pública a curto prazo, em vez de optarem por ativos de maior risco. 

No entanto, as valorizações não refletem estes fundamentais. “A classe de ativos permanece historicamente barata em termos absolutos e relativos, em comparação com os segmentos de high yield, e sofre episódios de volatilidade, devido à sua natureza de elevado beta”, afirma Jérémie Boudinet. Os CoCos denominados em euros oferecem atualmente uma yield média até à opção de compra (call) de mais de 11% e uma yield média perpétua de cerca de 9% (ou seja, partindo do princípio de que a opção de compra nunca é exercida, o que é muito conservador). 

Riscos pendentes

Em termos de riscos que o gestor deteta, continua preocupado com o estado do sistema bancário regional norte-americano. “Assemelha-se ao sistema bancário espanhol em 2009, com demasiados bancos pequenos e com uma governação inadequada, sem uma verdadeira supervisão reguladora, insuficientemente capitalizados e com demasiados ativos de risco (detêm a maior parte do mercado norte-americano de empréstimos imobiliários comerciais)”, argumenta.

Na sua opinião, os reguladores decidiram finalmente regulamentá-los adequadamente, mas a consolidação e as liquidações parecem inevitáveis. “Felizmente, não vejo nenhum risco de contágio para os grandes bancos norte-americanos, nem para os europeus, que seguem regras muito mais rigorosas há mais de uma década”, afirma. 

Além disso, Jérémie Boudinet não se preocupa muito com o facto de os bancos europeus continuarem a ver a sua rentabilidade ser diminuída pelos impostos governamentais, pelas maiores remunerações dos depósitos ou pela escassa produção de novos empréstimos, uma vez que o que nos interessa é, antes de mais, a solidez dos seus balanços. 

Posicionamento do La Française Sub Debt

E como é que isto se reflete no La Française Sub Debt, fundo com Rating FundsPeople 2023? Reduziram a sua exposição a CoCos com cupões mais baixos (abaixo de 5%), cuja convexidade parece atrativa em termos de rendimento, mas que pode ser uma armadilha para o valor num contexto tão volátil.

Em consequência, aumentaram a exposição a CoCos com cupões superiores a 8%, que são muito menos voláteis e oferecem uma componente de carry mais seguro. Também aumentaram a exposição a dívida subordinada de seguradoras, que será resgatada nos próximos três anos, uma vez que já não cumprem os requisitos regulamentares e, por conseguinte, devem ser resgatados na sua data de call. “Podem oferecer um carry de 6% por ano com uma volatilidade bastante baixa, se forem bem escolhidos”, argumenta o gestor.