Os fundos de investimento foram incluídos no ordenamento jurídico português em 1965, tendo vindo a sofrer uma evolução significativa no sentido da harmonização e construção do mercado europeu de capitais.
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Introduzidos no ordenamento jurídico português em 1965, os fundos de investimento sofreram uma evolução significativa, tendo o seu crescente desenvolvimento sido determinante para a construção do mercado europeu de capitais, onde a desejada harmonização tem desempenhado um papel fulcral. Todavia, não obstante a necessidade e esforços de uniformização, a verdade é que mesmo em matéria regulatória comunitária não existe (ainda) uma efectiva harmonização dos Organismos de Investimento Colectivo (“OIC”), coexistindo OIC harmonizados com regimes especiais de natureza regulatória para certos tipos de OIC.
Ora, se no plano regulatório os OIC não estão integralmente harmonizados, no plano fiscal essa harmonização está ainda mais longe de se atingir dado que no âmbito da União Europeia foi especificamente salvaguardada a competência e exclusividade dos Estados Membros em matérias fiscais não harmonizadas, tendo o Tribunal de Justiça reconhecido por diversas ocasiões que as disparidades entre regimes fiscais não são contrárias ao direito europeu.
Num quadro de relativa liberdade quanto à determinação do regime fiscal dos fundos de investimento (relativa, dado que essa liberdade não deverá ser exercida de forma discriminatória e não justificada), não surpreende pois que o regime fiscal dos fundos de investimento, em especial no que toca à tributação dos investidores, distinga entre fundos que se constituam e operem de acordo com a legislação nacional dos restantes fundos (ditos “estrangeiros”).
Uma análise da competitividade fiscal dos fundos numa perspectiva do investidor (e para estes efeitos, fora de uma actividade empresarial) pode e deve ser feita a dois níveis distintos: de um lado considerando o investimento via fundo nacional vs. investimento directo, do outro comparando o investimento via fundo nacional vs. fundo estrangeiro.
Na primeira vertente é de notar que a solução adoptada para a tributação dos fundos de investimento nacionais, contrariamente à solução adoptada por outros países da União Europeia, assenta numa tributação do próprio fundo, de forma cedular (i.e., em função da natureza dos rendimentos), em moldes muito idênticos aos estabelecidos para efeitos de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (“IRS”), verificando-se, por um lado, a não dedutibilidade fiscal de encargos financeiros suportados com financiamento obtido, e, por outro, a impossibilidade de compensação de perdas apuradas numa categoria com ganhos apurados noutra. Esta impossibilidade de compensação apresenta-se, desde logo, como uma primeira limitação à competitividade do regime fiscal português uma vez que a tributação efectiva do fundo não reflecte a real valorização do seu património global e, consequentemente, o valor das respectivas unidades de participação. Ora, não obstante a isenção em sede de IRS para os respectivos investidores individuais (residentes e não residentes), dependendo da efectiva tributação do fundo, poderá em determinadas circunstâncias a carga fiscal acrescida dos custos de estrutura do próprio fundo de investimento ser superior à que eventualmente seria suportada num investimento directo.
Já quanto aos investidores não residentes, a aparente benéfica isenção de tributação dos rendimentos das unidades de participação poderá revelar-se ineficiente quando comparada com um investimento directo. Efectivamente, o fundo será tributado a taxas que, em regra, variam entre 25% e 28%, sendo que nos casos de investimento directo a maioria dos investidores poderia beneficiar das taxas reduzidas dos Acordos de Dupla Tributação celebrados por Portugal (entre 10% e 15%, com isenção via da regra de mais-valias mobiliárias) ou de isenções previstas na legislação nacional.
Já se compararmos a competitividade fiscal dos fundos numa perspectiva fundo nacional vs. fundo estrangeiro, a decisão do investidor nacional deverá passar, necessariamente, pela determinação da carga fiscal suportada pelo fundo vs. tributação suportada enquanto investidor. Efectivamente, se os rendimentos auferidos por investidores individuais de unidades de participação de fundos nacionais estão isentos, sendo a tributação efectuada ao nível do fundo a taxas que variam em regra entre 25% e 28%, já os rendimentos auferidos de unidades de participação de fundos estrangeiros serão sujeitos a tributação em Portugal. Ora, é neste domínio que encontramos um dos traços discriminatórios do regime: caso os rendimentos sejam pagos com intervenção de agente pagador em Portugal, a taxa aplicável será de 28% (em linha com a taxa aplicável aos rendimentos de capitais). Contudo, se no acto de pagamento essa intervenção não tiver lugar, então os rendimentos serão obrigatoriamente englobados e tributados às taxas gerais de IRS, podendo atingir um máximo de 56,5% (o que carece de uma maior reflexão por parte do legislador fiscal). Assim, e além da necessária consideração da carga fiscal incidente sobre o fundo estrangeiro (sendo que, em regra, os mesmos têm um tributação residual ou até mesmo poderão estar isentos) ou sobre a respectiva tributação à saída (a existirem; veja-se o caso das SICAV Luxemburguesas onde não existe tributação à entrada nem à saída), será ainda necessário considerar a tributação portuguesa que incidirá sobre os referidos rendimentos, bem como a (in)existência de agente pagador em território português, dado que dela dependerá uma tributação potencialmente elevada para o dobro.
Do exposto resulta que a disparidade de regimes fiscais entre fundos nacionais e estrangeiros, quando associada à complexidade e incoerências do regime fiscal português, condiciona significativamente a decisão de investimento, que assim deixa de ser norteada por critérios exclusivos de eficiência de gestão de patrimónios e rentabilidade de carteiras.