Carlos Pinto (Optimize IP): "A recessão deverá chegar na segunda metade do ano às economias mais avançadas"

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Carlos Pinto. Créditos: Vitor Duarte

TRIBUNA de Carlos Pinto, gestor sénior de Investimentos da Optimize Investment Partners.

Do lower for longer para o higher for longer em pouco mais de um ano.

Tal como se previa, na primeira metade do ano tivemos um prolongar do ciclo agressivo de subidas das taxas de juro por parte dos bancos centrais num ataque à inflação em níveis nada usuais nas economias desenvolvidas. Como consequência desta contração monetária, assistimos ao primeiro abalo com três bancos regionais americanos a serem intervencionados perante a elevada corrida aos depósitos. Adicionalmente, a crise no Credit Suisse, que ameaçava ser sistémica, foi solucionada pela célere intervenção do regulador ao ser incorporado na UBS.

Ao longo do semestre, as subidas das taxas de juros dos bancos centrais, levaram a um alívio da inflação, direcionando-as no caminho para uma maior convergência para os objetivos dos bancos centrais. Como consequência, a recessão deverá chegar na segunda metade deste ano às economias mais avançadas, o que deverá indicar que está para breve o fim do atual ciclo de subidas das taxas de juros, sendo esta situação uma boa oportunidade para perfis mais conservadores, mais focados no investimento em obrigações.

EUA

Durante o semestre, o frenesim à volta do debt celling foi crescendo com o prolongamento das negociações entre democratas e republicanos, tendo o acordo para aprovação do levantamento do limite de endividamento acontecido no seu limiar, evitando assim a entrada do país em incumprimento. A incerteza que assolou a credibilidade da banca americana, associada à baixa remuneração dos depósitos, ditou a saída destas aplicações bancárias para os fundos de mercado monetário e de obrigações, que oferecem taxas de rentabilidade muito mais atrativas. A Reserva Federal aumentou o seu balanço em mais de 400 mil milhões de dólares ao garantir linhas de liquidez para os bancos, anulando a redução feita nos meses anteriores. Os grandes bancos também tiveram um papel relevante como agentes estabilizadores ao assegurarem a liquidez necessária aos bancos regionais, levando à desejada maior consolidação do sistema financeiro americano. Relativamente à política monetária, a Fed aligeirou o ritmo de subidas tendo subido as taxas por três ocasiões em 0,25% cada para os 5.25%, muito embora o mercado ainda aguarde mais duas subidas, como forma de direcionar a inflação para os níveis pretendidos. Os dados da inflação e os números do emprego ainda continuam demasiado robustos o que está a levar ao adiamento da inflexão da política monetária, suportada pela revisão em baixa da taxa de desemprego para o final do ano para 4.1% face aos 4.5% anteriormente projetado, e pelo crescimento económico nos 1%, acima dos 0.4% antecipados em março. 

Perante este cenário, antecipamos que a economia americana entre em recessão ainda este ano, e que o início de corte das taxas de juro aconteça no primeiro trimestre do próximo ano.  

Europa

Na zona euro, o BCE, de uma base mais atrasada, subiu em seis níveis, dos 2% para os 3.5% a taxa de depósito, sendo estimado mais duas subidas até ao final do verão devendo terminar nos 4%. O organismo está numa espécie de navegação à vista, ou seja, qualquer decisão vai ser condicionada à evolução dos dados da inflação que permanecem ainda muito acima dos 2% e, ao mesmo tempo, condicionada ao abrandamento da economia. A Alemanha entrou em recessão técnica, atingindo no 1º trimestre deste ano, o segundo consecutivo de crescimento negativo, muito pressionada pelos elevados custos energéticos na sua atividade industrial após o embrago à Rússia. Se por um lado, no 2.º trimestre deste ano, estes custos já aliviaram, por outro lado, o setor industrial vai continuar pressionado pelo agravamento dos custos de financiamento e dos salários. As últimas estimativas do BCE colocam a inflação nos 5.4% para o final do ano de 2023, 3% de 2024 e 2.2% de 2025. As projeções para o crescimento económico foram revistas ligeiramente em baixa para 0.9% em 2023 e 1.5% para 2024.

Japão

O Banco do Japão (BoJ) reforçou o seu compromisso numa política monetária ultra expansionista iniciada já algumas décadas, com períodos de inflação baixa e até mesmo deflacionária. Neste semestre, a inflação registou patamares não observáveis nos últimos anos, ainda assim em níveis mais controlados que os seus pares ocidentais. Apesar de há mais de um ano estar acima da meta do banco central (2%), os atuais 3.4%, não estão a alarmar o organismo que prefere continuar a sua política de estímulos à economia, aproveitando estes números para proporcionar um impulso ao consumo interno, já que os salários estão indexados à inflação. Após décadas de inflação nula, este semestre assistiu ao maior incremento salarial dos últimos 25 anos. 

Mercados emergentes

Os mercados emergentes tiveram na generalidade um desempenho divergente entre os seus membros, genericamente condicionada pelas suas dinâmicas de crescimento.

A China, esteve mais pressionada. A reabertura após praticamente três anos em confinamento, prometia trazer um forte ímpeto consumista, no entanto, acabou por não se materializar com a menor confiança do consumo e um arrefecimento do mercado imobiliário, materializando-se numa acumulação de poupança da população de 20% nos quatro primeiros meses do ano. Em resposta e numa tentativa de estimular o consumo, PBoC, o banco central chinês, cortou as taxas de depósitos em 10 pontos básicos para os 3.55%, taxa indexada aos empréstimos pessoais e às empresas assinalando o primeiro corte dos últimos 10 meses. A economia deverá crescer apenas entre 5% e 6%, um abrandamento assinalável face à tendência das últimas décadas.

Por outro lado, a Índia esteve mais animada com a inflação abrandar para os 4.25%, nível mais baixo dos últimos 25 meses, e muito próximo da meta do Reserve Bank of India, pelo que antecipamos que os atuais 6.5% seja o pico da taxa de juro diretora antes da inflexão para uma trajetória de cortes, o que deverá reforçar o impulso consumista, e colocar a economia na liderança do crescimento económico mundial. Sendo uma economia muito dependente da importação de petróleo, já está a beneficiar da queda do preço da energia. Adicionalmente pelo crescimento exponencial do interesse das empresas globais nos mais variados segmentos da economia global, em diversificar as cadeias de produção/fornecimento para diminuírem a sua dependência à China, caminhando a passos largos para se tornarem num dos principais hubs produtivos da economia global.

Ações

Os mercados acionistas apresentaram valorizações expressivas neste início de ano, em pleno contraste do que foi o ano passado. Particularmente as ações de crescimento superaram as de valor a antecipar o fim da subida das taxas de juro o que permite dar uma melhor visibilidade às empresas. 

Reiteramos a nossa preferência pelas denominadas quality growth, empresas líderes nos seus nichos de mercado e com o denominado pricing power, ou seja, as que mais capacidades têm de passar os preços da inflação nas suas vendas permitindo preservar as suas margens, sendo a exposição a estes negócios, a melhor defesa para o atual período de inflação elevada. Reforçamos a nossa convicção nas empresas tecnológicas com baixa alavancagem, por serem as mais capacitadas de integrar as várias valências da Inteligência Artificial em várias indústrias, que permitam aumentar a produtividade, sendo estas as mais bem posicionadas para preservar e até aumentar as suas margens, patenteando uma verdadeira arma contra a inflação. 

No mercado emergente, estamos mais cautelosos nas ações chinesas, que transacionam em múltiplos historicamente baixos, mas preferimos aguardar por mais estímulos que permitam devolver a confiança ao consumo tanto no mercado interno como global. O mercado indiano, assim como Indonésia, Vietname estão a beneficiar da necessidade de redução da dependência de vários blocos económicos da dependência à China, da diversificação das suas redes de fornecimento e produção, para além do crescimento natural caracterizado pela qualificação, demografia e urbanização da sua população.

Obrigações

O mercado obrigacionista já regista performances positivas, apesar das taxas de juro dos bancos centrais terem subido ao longo deste período, essencialmente devido à incorporação das expetativas de estarmos próximos do fim deste ciclo e também pelo carry de partida, ou seja, desde o início do ano que as yields, proporcionavam um rendimento que está a permitir acomodar algumas subidas das taxas de juro. As obrigações de elevada qualidade creditícia já oferecem uma verdadeira alternativa aos investidores para alocarem a componente mais conservadora dos seus investimentos. As yields a que transacionam, proporcionam um rendimento que permite proteger do impacto da inflação para o médio e longo prazo e de também de eventuais revisões em alta para a subida das taxas de juro.

A componente High Yield transaciona com yields muito tentadoras, mas neste campo requer uma seleção mais minuciosa. Temos preferência por empresas menos alavancadas, com boa geração de cash flow e que estejam presentes em segmentos com maior visibilidade. No estágio atual deste ciclo, antecipamos uma normalização da curva das taxas de juro e um alívio dos atuais níveis, pelo que gradualmente estamos a aumentar a duração das carteiras.

Maiores riscos

Numa nova conjuntura de inflação mais elevada, e com o excesso de capital alocado em depósitos bancários, não se vislumbra que estes produtos proporcionem taxas de juros acima da inflação, pelo que o maior risco é a alocação das poupanças de longo prazo nos produtos com o selo de produto garantido. O património que se pretende preservar hoje, com as taxas oferecidas a situarem-se bem abaixo da inflação vai levar a uma degradação cada vez maior da poupança acumulada. Deste modo, insistimos que o aforrador português deve procurar produtos que ofereçam retornos que pelo menos acompanhem a taxa de juro de mercado, mesmo que seja através dos fundos de mercado monetário ou fundos de obrigações sempre alinhados com o horizonte temporal do investidor.

Fundo recomendado

Recomendamos o fundo Optimize PPR Ativo, com uma abordagem global e diversificada entre ações e obrigações. Trata-se de um fundo com track record de 15 anos, cujo desempenho tem provado ser uma excelente solução de poupança que combina o potencial das ações, até 55% de exposição, com a componente de obrigações, que contribui para diminuir a volatilidade do fundo e aumentar a segurança do investimento. Os atuais investimentos nesta componente são selecionados por forma a que a rentabilidade supere os níveis da inflação prevista, proporcionando deste modo uma maior preservação de capital e valorização do património a longo prazo.

Conclusão

Em termos macroeconómicos, antecipamos um abrandamento da inflação nos EUA e na Europa que se deverá traduzir em breve no fim das subidas das taxas de juro dos bancos centrais. Apesar das taxas continuarem a subir neste ano, assistimos a uma valorização da generalidade das obrigações, confirmando que o nível de rendimento que já proporcionavam permite acomodar este impacto final das subidas de taxas. Esperamos que o término deste ciclo de subidas, se traduza numa performance mais elevada das obrigações de elevada qualidade creditícia

Os mercados acionistas devem continuar suportados pela perspetiva de melhoria nos resultados das empresas com a utilização da Inteligência Artificial, e estabilização do preço da energia, nomeadamente na Europa, com o preço do gás a atingir mínimos de junho de 2021.

Historicamente, os períodos de inflação acabam por ser bons para os ativos de risco, ações e obrigações, uma vez que antecipamos que o alívio nos juros irá sentir-se no primeiro trimestre de 2024.